São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 1995
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Mercado mundial de autoveículos e o Mercosul

NELSON TAVARES FILHO

A produção de autoveículos não foge à tendência mundial de globalização na organização produtiva mundial.
Neste setor, a previsão é de diminuição do número de fabricantes mundiais de veículos, situando-se, em futuro próximo, em torno de oito grandes montadoras mundiais, com plantas em diversos países.
A concentração ainda maior da produção proporcionará ganhos de competitividade -principalmente quanto à qualidade e preço- e maximizará o retorno sobre os investimentos. As estratégias desses conglomerados serão ditadas em escala planetária.
Neste cenário, os países produtores de autoveículos deverão estar atentos para dois fatores principais: a) entender a lógica que induz os investimentos dessas empresas para proporcionar-lhes as condições devidas para o aumento da produção em seus países, impulsionando a geração de empregos, tributos e riqueza; b) compreender que a globalização é irreversível e proporcionar condições para que os custos inerentes à produção em seus países sejam compensados com a devida proteção, até que as condições internas de fabricação se igualem às externas.
A capacidade mundial instalada de produção de autoveículos situa-se em torno das 53 milhões de unidades, havendo uma capacidade ociosa de 5 milhões. Desde a década passada não houve grandes investimentos em aumento da capacidade, pois o mercado nos países desenvolvidos não tem apresentado crescimento significativo.
Esses países têm uma média de dois habitantes por veículo, sendo que nos Estados Unidos é de 1,3 habitantes por veículo. Somente em três países estão ocorrendo aumentos significativos de produção: China, Brasil e Índia.
A Argentina, que conseguiu aumentar a produção de menos de 100 mil unidades (1990) para 500 mil em 1994, deverá este ano produzir menos de 400 mil veículos.
Em 1994 o Japão perdeu a liderança da fabricação de veículos para os EUA. A indústria japonesa apresenta atualmente uma capacidade ociosa de cerca de dois milhões de veículos, que, se direcionados à exportação por preços políticos, tornam-se capazes de desestabilizar a produção de qualquer outro país, menos a dos EUA.
Essa capacidade ociosa pode ser atribuída a três fatores: a) o desempenho da economia japonesa nos dois últimos anos; b) a relação entre o dólar e o iene, que, situando-se na faixa de 100 ienes/dólar, dificulta a assimilação dos carros japoneses pelos americanos; e c) a melhoria no desempenho da indústria automobilística americana, depois do plano de modernização e proteção empreendido pelo governo Reagan, que visava melhorar a situação da balança comercial americana.
No âmbito do Mercosul, o governo brasileiro acaba de fechar acordo com os demais países para o estabelecimento de uma política comum. Era um item pendente e que tinha sido subestimado pelas autoridades brasileiras que assinaram o "Acordo de Ouro Preto".
Mercado comum implica política industrial comum, pois, na inexistência desta, os investimentos se dirigem ao país que oferece maiores vantagens. Esta é a disfunção que este acordo vem reparar. As estimativas de investimentos das montadoras de veículos (ver quadro) estavam pendentes de realização por falta desta e de outras definições que a MP vem apresentar.
Neste sentido, a redução da alíquota de importação de máquinas e equipamentos irá produzir significativo barateamento dos investimentos, sem prejuízo da empresa nacional, que, através de acordo com as montadoras, será responsável por fornecer 50% do investimento em máquinas.
Outro fator considerável é a redução do índice de nacionalização dos veículos, atualmente em 90%. Por meio de acordo com os fabricantes de autopeças, este índice será reduzido para 70%, o que permitirá a importação, sem ônus, de itens que não são fabricados competitivamente em preço e qualidade no Brasil.
Este índice de nacionalização poderá até ser inferior, nos três primeiros anos, para as montadoras que vierem a se instalar no país, vontade já manifestada pela Renault (investimento de US$ 1 bilhão) e pela Toyota.
Ressalte-se que, ao estender ao setor de autopeças as vantagens concedidas às montadoras, o governo dá início ao que poderá ser uma reformulação do setor. Este apresenta um perfil de oferta ainda muito pulverizado, não permitindo que a velocidade de acumulação acompanhe a modernização requerida.
No entanto, esta medida é importante, mas insuficiente, requerendo-se do governo um amplo plano de reestruturação do setor, como base para o fortalecimento de um pólo metalmecânico gerador de tecnologia no país.
O governo enviou ao Congresso o seu Plano Plurianual de Investimento (PPA). Nele constam diretrizes gerais do governo, um amplo plano de obras que deverá ser executada por meio de colaboração com a iniciativa privada e a expectativa de crescimento médio do PIB de 4,5% para os próximos quatro anos.
Com o novo regime automotivo para o Mercosul, o governo dá um passo concreto para alcançar essas metas. Faltam políticas semelhantes para os demais setores. Mas é um bom começo.

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