São Paulo, terça-feira, 19 de dezembro de 1995
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Sob o império do rabo

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - Na década de 70, Pedro Malan, já economista, PhD em Berkeley, opunha-se ao modelo econômico. Observado o biotipo da época, pode-se dizer que era de esquerda. E, como todo tal, gostava de fustigar a política econômica do regime de 64.
Num de seus escritos, queixou-se dos juros da dívida externa. Aproveitou para verter para o português um provérbio que os ingleses costumam usar para definir situações consideradas absurdas: "O rabo está balançando o cachorro".
Hoje, sentado na cadeira que alvejava, Malan passou, por assim dizer, à condição de domador do cachorro. E, vez por outra, descobre que, também sob seu tacão, o animal pode desgovernar-se.
Agora mesmo, Malan vive um desses fatídicos momentos em que o tronco do cão parece dançar no ritmo ditado pela cauda. Ele não é mais o titular da Fazenda. É o ministro da pasta cor-de-rosa.
Tudo à sua volta é irrelevante diante da pasta. A política de juros continua na berlinda. O sistema financeiro, cambaleante, faz plantão à porta do Tesouro. Mas há duas semanas que Malan só tem olhos para a pasta.
No último sábado, o absurdo roçou o paroxismo. Malan chamou a seu gabinete a TV Globo e o jornal "O Globo". Em entrevistas separadas, elogiou a honradez dos políticos catalogados na pasta.
O ministro parecia cachorro da situação. Ledo engano. Após discar para Fernando Henrique, na China, Marco Maciel começou a balançar Malan. Coube ao vice-presidente informar às vítimas da pasta que o ministro os defenderia publicamente. Malan apenas seguiu o roteiro.
O ministro, pródigo nos elogios, é avaro nas informações que de fato interessam. Em recente depoimento no Senado, perguntaram-lhe detalhes sobre a ação do Banco Central na crise da banca privada.
Malan mediu cada palavra. Sob o pretexto de resguardar informações sigilosas, sonegou dados aos senadores. A seu lado, Gustavo Loyola fez o mesmo.
E o país segue desinformado sobre a incompetência do governo na administração da crise do sistema bancário. Sob o império do rabo, utilizam-se recursos públicos sem prestar contas ao contribuinte.

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