São Paulo, quarta-feira, 20 de dezembro de 1995
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FHC e o analista Tom Cavalcante

LUÍS NASSIF

A análise sobre a crise que mais está atraindo a atenção de conselheiros do PFL é um show do humorista Tom Cavalcante, no Rio de Janeiro.
Quando dispara a imitar o presidente Fernando Henrique Cardoso, o auditório -constituído de classe média que não está nem aí para análises sobre demandas agregadas e que tais- quase vem abaixo.
Tom veste um ar solene, emposta a voz e começa a criticar os "fracassomaníacos" que não acreditam no plano. "Assim que eu voltar de minha próxima viagem internacional, vou explicar a todos porque o Real é bom", diz o personagem, e prossegue no lero-lero acadêmico que mata de rir quando praticado pelo imitador, mas mata de raiva quando interpretado pelo imitado.
O presidente já queimou um ano de seu mandato com o aprendizado -inevitável em todo mundo que senta no trono presidencial. Tem mais um ano pela frente para provar que seu governo é viável. Senão, a debandada começará já no final do próximo ano.
Alguns de seus aliados fortes -como o próprio PFL- são fisiológicos e, como tal, não rasgam apoios.
Candidato a presidente pelo Colégio Eleitoral, Paulo Maluf chamou o PFL e ofereceu-lhe quatro ministérios, inclusive a Fazenda. A proposta foi recusada porque as raposas pefelistas sentiram que Maluf jamais seria um ídolo popular. E, portanto, apoio a ele garantiria poder provisório, mas não a essência do poder, que são os votos.
Se a imitação do humorista continuar a arrancar gargalhadas da classe média, não haverá cargo que mantenha a tripulação pefelista a bordo.
Intocáveis
A imagem do presidente precisa urgentemente ser revertida, sob pena de comprometer as reformas -que são problema nosso- e a reeleição -que é problema deles.
O primeiro passo é rever sua postura em relação ao dia-a-dia de sua administração. O centralismo indeciso não deu certo. A reengenharia não funcionou. Então, tem que mudar de estilo.
Só se muda o estilo se houver clareza sobre as metas a serem alcançadas. O presidente precisa definir o que quer, como quer e em que prazo quer. Saber cobrar quando houver atrasos e arbitrar quando houver impasses.
FHC permite o conflito, mas não decide. E não deixa ninguém decidir. Permite que as diferenças fiquem pairando no ar, como almas penadas. Contenta-se com uma boa explicação, mesmo que não reverta em nenhum resultado.
O segundo passo é entender que não podem existir intocáveis em seu ministério. Há a necessidade de um ministério de resultados -de ministros tocadores, gerentes que ofereçam mais trabalho e menos explicações.
Demissão de ministro é gesto revigorador, porque passa a sensação de que há consciência sobre erros e vontade de acertar.
O terceiro passo é deixar de lado esse discurso prepotente de tripudiar sobre as vítimas do plano e não admitir erros do Real. Não há nada pior para a opinião pública do que estar vivendo o seu inferno astral de inadimplência e desemprego, parte dela sabendo que está pagando pelos erros na condução da política econômica, e assistir diariamente ao presidente ou seu ministro da Fazenda tripudiando sobre suas desgraças -acusando-os de incompetentes ou inimigos do Real- como se estivessem batendo boca em saraus acadêmicos.
O péssimo ator político chamado Pedro Malan, aliás, conseguiu o milagre de transformar uma pessoa extremamente agradável -o próprio Malan- num poço de prepotência vazia.
Audiência
Estadista que se preze reconhece dificuldades, admite erros e aponta rumos. Para o grosso da opinião pública, dificuldades são algo palpável -e os rumos, uma incógnita. Para o presidente passar a confiança de que conhece os rumos, precisa, minimamente, passar a sensação de que sabe das dificuldades.
Senão, o aumento da audiência dos shows de Tom Cavalcante será diretamente proporcional à redução da audiência de FHC.
Crédito
A decisão da Fazenda e do Banco Central de afrouxar o compulsório e passar a dar tratamento mais global à questão da inadimplência, principalmente entre as pequenas e médias empresas, mostra que, pelo menos desta vez, os alertas da coluna não foram interpretados como conspiração contra o Real.

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