São Paulo, quarta-feira, 20 de dezembro de 1995
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Mudar em 96?

ANTONIO DELFIM NETTO

Temos insistido à exaustão que, sem um crescimento econômico sustentado de 5% ou 6% ao ano, não resolveremos nenhum de nossos problemas essenciais. É aqui que reside a armadilha em que nos meteram as políticas cambial e tarifária irresponsáveis.
Elas tiveram a sua tarefa complementada pela política monetária restritiva, com taxas de juros reais quatro ou cinco vezes maiores do que as de nossos parceiros. O Brasil é hoje penetrado de todas as formas e, graças a essa combinação diabólica de câmbio sobrevalorizado, sistema tarifário descuidado e altas taxas de juros, é absolutamente impotente para penetrar no mercado internacional.
O sr. presidente chamou a atenção dos chineses para o "sucesso" de nossas exportações, que vão crescer 7% em 1995. A resposta foi um discreto sorriso das autoridades chinesas, que se penitenciaram pelo fracasso de seu comércio exterior: as exportações chinesas vão crescer "apenas" 20%! Pois bem, não abrindo espaço para as importações, porque não há exportações, ficamos condenados a um crescimento medíocre.
O Plano Plurianual falava em crescimento de 4% em 1996, mas agora a maior probabilidade é a de que ele seja alguma coisa parecida com 2% ou 3%. E o que nos espera, sem uma mudança radical na política econômica, são alguns anos de "stop" and "go" com a destruição "não-criativa" de amplos setores de nossa economia.
A sociedade precisa saber que suas dificuldades não decorrem apenas dos problemas de ajustamento à globalização. Elas foram magnificadas pela imposição de uma política econômica que criou uma competição absolutamente desleal: câmbio sobrevalorizado, tarifas irresponsáveis dentro do quadro do custo Brasil, sistema tributário discriminatório contra a produção nacional, política creditícia altamente seletiva que destruiu a higidez da pequena e média empresa nacional e a mais alta taxa de juro real do mundo.
A sociedade suporta tudo isso enganada pela retórica de que esses são os custos necessários do ajuste. De que não há dificuldade futura sem sacrifício presente. De que os que morrerem no caminho morrerão tranquilos porque o fizeram pelo bem da pátria. Agricultores, industriais, banqueiros nacionais, suicidai-vos para apressar a salvação do Brasil, é o apelo do burocrata brasiliense!
Que bom quando o Brasil ficar reduzido apenas aos consumidores. Sem produtores "ineficientes" para atrapalhar, ninguém terá problema para consumir produtos chineses... É a "teoria econômica", esse saber hegemônico que emana dos gases do Paranoá, que nos oferece esse futuro venturoso. E é pedir muito um pequeno suicídio coletivo no altar da "ciência"?
Precisamos de equilíbrio fiscal e precisamos de estímulo ao setor exportador. O problema é que a experiência mundial mostra (veja Alesina e Perotti -"Adjustments in OECD Countries") que o sucesso do ajuste fiscal depende dele ser feito durante um período de crescimento relativamente vigoroso e à custa de corte das despesas, não de aumento da receita.
Os erros de 1995 podiam ter sido evitados. O sucesso no combate à inflação (que é inegável e deve continuar) foi obtido com custos sociais muito superiores aos necessários e deixou uma infinidade de problemas. Vamos mudar em 1996?

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