São Paulo, sábado, 23 de dezembro de 1995
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'Nixon' faz lembrar final do governo Collor

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Imagine um filme que mostre os bastidores da Casa da Dinda nos dias finais do governo Collor: os diálogos entre Fernando e Rosane, os monólogos do presidente embriagado, o momento em que ele assinou sua renúncia.
Mais: um filme de boa qualidade artística, com grandes atores e atrizes nos papéis dos personagens recentes da história brasileira.
Seria sucesso certeiro no Brasil. É a mesma coisa nos EUA com "Nixon", o mais recente filme do talentoso, controvertido e arrojado Oliver Stone, de "Platoon", "JFK", "The Doors" e "Natural Born Killers".
Um panfletário de esquerda desde a sua primeira grande produção ("Salvador", de 86), Stone surpreende mais uma vez o país com a sua biografia do superconservador Nixon.
Não que Stone tenha traçado retrato simpático do mais odiado presidente da história dos EUA. Mas, pelo menos, deu-lhe uma abordagem caridosa, que denota alguma empatia entre o cineasta e seu objeto.
Talvez ela exista mesmo. Stone é uma espécie de Nixon do cinema: origem modesta, sucesso construído sem padrinhos e graças a muito esforço pessoal, vítima permanente de ataques das elites.
Como "JFK", o principal problema de "Nixon" é a deliberada confusão entre fato e ficção. Imagens de documentários são superpostas às do filme de maneira delirantemente acelerada.
O "efeito Forrest Gump" é utilizado com frequência: o ator que vive Nixon (o sempre impressionante Anthony Hopkins) contracena com os verdadeiros interlocutores do presidente: de Kennedy a Kruchev.
O resultado é que muitos espectadores acham que o filme é uma versão fiel dos fatos. Mesmo que qualquer interessado em história contemporânea seja capaz de perceber inúmeras fantasias sem qualquer fundamento.
Uma absurda ligação entre Nixon e o assassinato de John Kennedy e o nunca antes aventado vínculo entre John Edgar Hoover e a morte de Robert Kennedy são apenas duas das mais escandalosas "revelações" do filme.
Para quem está interessado só em estilo, "Nixon" é um grande espetáculo: direção criativa e segura, elenco impecável, excelente trilha sonora, edição irretocável.

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