São Paulo, sábado, 23 de dezembro de 1995
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O real chega na política

DOMINGOS LEONELLI

O real está chegando, finalmente, à estrutura do poder no Brasil. O plano FHC desnudou a verdadeira face da economia ao lhe retirar o véu ora negro, ora colorido da inflação. Agora os incipientes movimentos de modernização política estão desnudando a prática atrasada das elites brasileiras, representadas fundamentalmente pelo PFL.
A pasta rosa é apenas o lado marrom desse aspecto da contradição entre o arcaico e o moderno da política e da economia no Brasil de hoje. A direita exibe um discurso privatista, mas diante da realidade concreta suas propostas práticas foram, e continuam sendo, estatizantes. A aparente contradição formal esconde, no entanto, uma contradição real com o compromisso tucano, insistentemente reiterado por Fernando Henrique, Sérgio Mota e José Serra, que define como objetivo estratégico a desprivatização do Estado brasileiro.
Será que o principal responsável pelo atraso pode ser o principal parceiro da modernização? A crise atual parece estar revelando que isso não é possível.
Entretanto o indiscutível sucesso da primeira etapa da estabilização da moeda e a razoável aceitação das reformas constitucionais permitiriam ao presidente examinar a hipótese de uma reforma ministerial. Não uma mera troca de ministros. Mas um movimento que lhe possibilitasse a ampliação da sua base de sustentação política, social e parlamentar. Seria ingênuo sugerir a exclusão do PFL dessa base. Ingênuo e inútil, pois o PFL, na boa tradição da antiga Arena, não concebe sua própria existência fora do governo. Goza de estabilidade nessa área.
Parece, no entanto, razoável a busca de um apoio mais efetivo do PMDB, de segmentos modernos da esquerda e de setores mais modernos da centro/direita.
O presidente poderia também atrair para o governo expressões mais representativas da indústria, da agricultura, do trabalho e, especialmente, da política, no seu plano mais concreto que é o municipalismo. Ministros que conheçam a vida e a política.
Ministros que não precisem bajular, mas que reconheçam sem arrogância as responsabilidades que pesam sobre os ombros dos prefeitos, vereadores, deputados, senadores e governadores. Ampliada sua base política-parlamentar, o governo reduziria o peso relativo do seu aliado mais exigente sem rompimento.
A reforma ministerial deveria corresponder, também, à implementação de um Plano Real para o social, não como uma política compensatória, mas sim como parte integrante da política econômica do governo e da lógica do mercado. Reforma agrária, políticas agrícolas e industrial, política de emprego e renda, articulação entre grandes investimentos e pequenas e microempresas, popularização das grandes bandeiras nacionais da modernização, do desenvolvimento e da revolução educacional.
Nesse patamar inverter-se-ia o quadro de desempenho no Congresso, passando o PSDB -sem precisar inchar- a cumprir o papel principal de articulador de grandes consensos nacionais.

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