São Paulo, domingo, 24 de dezembro de 1995
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O mistério que envolve o atacante Túlio

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Ele flanava por ali, como se envolto num halo de confetes e serpentinas, um imaginário copo na mão e aquele olhar benevolamente distante dos que estão em êxtase. De repente, a bola pinga na área, pimba, gol. Outra bola, de olhos cerrados, ajeita com o braço para o companheiro marcar o segundo. Mais uma bola alçada na área, alguém toca de cabeça, ele estica a perna -gol.
Que encantado pacto esse moço Túlio fez com as redes, que lhe permite ficar ausente 90 minutos de um jogo da seleção, como o de quarta-feira, e deixar o campo como o herói da virada de 3 a 1 sobre os colombianos?
Nesta minha longa vida, que já começa a roçar a prorrogação, vi artilheiros de todos os tipos: selvagens caçadores de gols, como Almir Pernambuquinho ou Serginho Chulapa; álgidos cirurgiões, como o gordo Coutinho, parceiro de Pelé; refinados estilistas, como Pagão ou Sócrates; artistas debochados, tipo Careca ou Toninho Guerreiro, onde poderia encaixar Túlio, que há tempos mantém média de mais de um gol por jogo, num futebol retrancado como o de hoje em dia.
Algo no seu estilo me lembra do argentino Luisito Artime, que defendeu o Palmeiras nos tempos da primeira Academia, na virada dos 60 para os 70.
Como Artime, Túlio não parece se entender muito com a bola, à qual reserva um tratamento breve e sem preâmbulos. Ela lhe chega, às vezes acabrunhada, noutras, esquiva, quando não contrafeita, e ele, simplesmente, sem afagos nem explicações, despacha-a para as redes. Ao contrário do craque, que mantém um relacionamento íntimo, sedutor mesmo com a bola, esta, para Túlio, é um objeto indesejável. Apenas um veículo, a mensagem de amor que ele envia às redes, dia sim, outro também.

Ainda sob os ecos da semana: a derrota do Atlético-MG diante do Rosário Central, na decisão da Conmebol, terça-feira, foi exemplar. Como havia goleado o time argentino no Mineirão por 4 a 0 e perdido o brilho do menino Cairo, machucado, no meio-campo, o Atlético entrou em campo com a chamada linha de três volantes marcadores: Carlos, Eder Lopes e Doriva. Resultado: 4 a 0 para o Rosário, que, nos pênaltis, ficou com a taça.
Ora, como esse desfecho veio se juntar às recentes experiências de Palmeiras e Grêmio, Santos e Fluminense etc., deixou de ser mera coincidência. O que quero dizer é que já passou da hora de nossos treinadores romperem com esse chavão, segundo o qual, coalhando-se o meio-campo de zagueiros travestidos de médios, sua defesa estará mais protegida. Estará se o adversário não partir pra cima com tudo. Se partir, mesmo um time modesto como o Rosário, é capaz de levar de cambulhada médios, beques e goleiro.
Outra coisa: mais uma vez, fica demonstrado que o futebol seria muito mais emocionante se fosse valorizado o número de gols.
Afinal, não é disso que a galera gosta?

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