São Paulo, quinta-feira, 2 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tráfico gera 9.000 empregos em favelas

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

O tráfico gera pelo menos 9.000 empregos no Rio e divide com o poder público ações de assistência social em morros.
A revelação sobre criação de empregos está numa pesquisa feita pelo deputado estadual Carlos Minc (PT-RJ), com técnicos da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e dirigentes de associações comunitárias.
A pesquisa foi realizada nos últimos três anos, a partir de entrevistas com traficantes e favelados.
Não há estudos sobre os investimentos totais do tráfico em assistência social. Os exemplos estão nas favelas: é comum que os grandes traficantes sejam vistos pelos moradores como "benfeitores".
É o caso de "Robertinho de Lucas", que nasceu na favela de Parada de Lucas (zona norte) e de lá entrou para o crime organizado, tornando-se um dos cinco traficantes mais procurados do Rio.
"Robertinho" é um dos patrocinadores do time de futebol da 2ª divisão Esporte Clube Lucas, que reúne mais de 300 atletas.
Também deu azulejo, pedra e cimento para a reforma da piscina comunitária e ajudou a reformar o Clube Recreativo Balanço de Lucas, sede dos bailes funk.
O traficante costuma distribuir material de construção e pagar contas que famílias carentes deixam nas farmácias e nas padarias.
"Até o asfalto da rua foi ele que botou. Dá camisa para o clube, ajuda todo mundo. Ele é amigo nosso. Dizem que ele vende droga, não sei, mas e daí?", afirma Elmarino Pereira, presidente do Esporte Clube Lucas.
Parada de Lucas tem 30 mil habitantes. Não há postos de saúde, rede de esgoto ou áreas de lazer.
Em dezembro, a favela ganhou um Centro Comunitário de Defesa da Cidadania, criado pelo Estado para atender Parada de Lucas e a favela vizinha, Vigário Geral.
O Centro oferece serviços gerais de assistência jurídica, cartório, expedição de documentos e orientação profissional.
Em Vigário-Geral, já começou a disputa pela sucessão de Flávio Negão —líder do tráfico na área, morto há uma semana— mas a favela ainda está de luto.
Negão era ao mesmo tempo temido e querido pelos moradores. Costumava dar festas e sempre organizava uma distribuição de brinquedos no Dia das Crianças.
"Diferente da instituição pública, a ajuda prestada pelo traficante é informal e tem ações pontuais. O traficante é um referencial para a comunidade", diz o sociólogo Caio Ferraz, secretário-executivo da Casa da Paz de Vigário Geral.
No morro de São Carlos (no Catumbi, zona norte), o líder do tráfico, Adílson Balbino, também preside a Associação de Moradores. O tráfico apóia e contribui com material e brinquedos para a creche municipal Papudinho. A prefeitura paga os seis professores e fornece material escolar.
O diretor da DRE (Divisão de Repressão a Entorpecentes), Maurílio Moreira, disse que o tráfico tem um sistema de previdência perfeito: oferece auxílio-prisão para a família —quando o traficante é preso— e dá pensão vitalícia em caso de morte.

Texto Anterior: Começam as demissões do Baneser na Cultura
Próximo Texto: Droga dá até R$ 500 por semana
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.