São Paulo, quinta-feira, 2 de fevereiro de 1995
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A vez do Estado

Vai-se tornando cada vez mais evidente —se é que já não estava— que a crise do Estado brasileiro é profunda demais para ser combatida com uma gestão meramente correta e honesta. Ela vai exigir, além desses pré-requisitos óbvios e indispensáveis, forte dose de ousadia, criatividade e inovação —e não apenas na esfera federal como nas estaduais e municipais.
Causa apreensão, nesse sentido, o desempenho inicial do governador de São Paulo, Mário Covas. O Estado mais rico da Federação, e com uma administração repleta de problemas de inquietante magnitude, está perdendo uma grande chance de sinalizar desde logo um novo caminho para o deteriorado setor público nacional.
É evidente que são positivas as gestões de Covas no sentido de rearranjar, inclusive com demissões, o funcionalismo paulista tão abusado como cabide de empregos por gestões passadas. Mesmo o afastamento do "fantasma" indicado para a secretaria de Esportes e Turismo mostrou adequada preocupação, ainda que "a posteriori", com o quesito moralidade. Porém, como dito acima, isso é fundamental, mas não basta.
No âmbito da privatização, por exemplo, uma esfera que poderia —esta sim— levar a uma mudança de fôlego e impacto na viciada estrutura atual do Estado, as manifestações do Executivo paulista são quase desanimadoras.
O argumento do governador de que privatizar não é solução para os problemas financeiros do Estado já indica uma lamentável resistência a esse imperativo da realidade. De resto, parece evidente que, se é difícil solucionar esses problemas com a privatização, muito mais difícil será fazê-lo sem ela. Isso, obviamente, sem prejuízo do indispensável saneamento da esfera pública.
O pior é que também no restante do país ainda não se vêem sinais claros de que exista a determinação oficial de fazer reformas realmente profundas. É como se os governantes não tivessem se dado conta da dimensão dos desafios à frente. O setor privado, forçado a enfrentá-los por anos de crise e pelo acirramento da concorrência, ajustou-se de forma radical.
Já o poder público, escudado na capacidade de contrair dívidas e mais dívidas, de avançar ainda mais no nosso bolso de contribuintes, atrasou seu ajuste interno o quanto pôde. Já agora serão necessários governantes de visão e coragem para pilotar o Estado através da imprescindível reestruturação.
É hora de Covas e de todos os novos mandatários brasileiros mostrarem que estão à altura da tarefa que lhes cabe.

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