São Paulo, quinta-feira, 2 de fevereiro de 1995
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O Brasil e as ONGs —uma visão de Londres

RUBENS ANTONIO BARBOSA

O presidente Fernando Henrique Cardoso tem se referido, em diversas oportunidades, à determinação de seu governo de desenvolver parceria e diálogo franco com a sociedade civil nos campos afetos à defesa e à promoção da cidadania.
Essa orientação decorre da prioridade que atribui ao objetivo de redesenhar os mecanismos do Estado —hoje, em suas palavras, não mais um organismo fechado— em função do maior grau de organização da sociedade brasileira.
Valorizar a contribuição que as organizações não-governamentais podem trazer para a implementação de políticas públicas constitui uma das consequências naturais e necessárias dessa orientação.
Esse é o fato novo, ainda não plenamente absorvido, com relação a essas entidades que, como já se disse, podem ser qualificadas de "organizações neo-governamentais".
No plano interno, abre-se às ONGs brasileiras a possibilidade de desenvolver parceria com o Estado, seja na discussão de grandes temas, seja na execução de medidas de interesse da sociedade.
No plano externo, a opção natural é acentuar nossa disposição para a transparência e o diálogo no relacionamento com as organizações não-governamentais internacionais, sobretudo aquelas mais influentes, algumas das quais, como a Anistia Internacional e a World Wide Fund for Nature, com sede no Reino Unido. Ao fazê-lo, devemos centrar esforços em fomentar a percepção da crescente convergência entre Estado e sociedade civil em nosso país.
Não há por que não reconhecer que a interação com essas ONGs, somada aos processos internos, contribui para tornar ainda mais aguda a consciência de nossos problemas, não só na sociedade, mas também na administração pública. A prioridade deve ser responder de forma positiva e prática a esses estímulos e, ao mesmo tempo, procurar expandir o escopo do relacionamento com as ONGs para além da demanda sobre casos pontuais.
É essencialmente nesse sentido que se enquadram as ações desenvolvidas pela embaixada em Londres. Como se sabe, Londres é um dos principais centros formadores da opinião pública mundial, e nesse tempo é inegável a influência das organizações não-governamentais. Entre outros projetos, a embaixada tem promovido visitas de membros da sociedade civil com atuação destacada no campo da promoção da cidadania, como o professor Paulo Sérgio Pinheiro, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, e d. Mauro Morelli, presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar.
Neste mesmo espírito, vem prestando apoio informal ao comitê, recentemente criado em Londres, da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e Pela Vida, e tem procurado apoiar as diversas organizações —muitas formadas por brasileiros— que desenvolvem atividades de assistência a comunidades carentes e crianças de rua no Brasil.
Como parte do processo de ampliação do diálogo que o Brasil vem desenvolvendo com a Anistia Internacional, o secretário-geral daquela organização, Pierre Sané, visitará o Brasil em março próximo. Será mais uma oportunidade para um diálogo franco com autoridades do governo brasileiro sobre questões de direitos humanos.
Tenho verificado que as organizações não-governamentais sediadas na Inglaterra, tais como a Anistia Internacional, a Survival International, a Anti-Slavery International e a World Wide Fund for Nature, vêm acompanhando com interesse a orientação imprimida pelo presidente Fernando Henrique Cardoso à ação de seu governo.
Exemplo dessa atitude positiva é a decisão recente da Survival International, dedicada à causa das populações indígenas, de suspender a vigília semanal que manteve por mais de dois anos em frente à embaixada para protestar contra invasão das terras ianomamis por garimpeiros.
O aprofundamento dos contatos com as ONGs que tratam de assuntos ambientais são particularmente importantes tendo em vista as discussões sobre a relação comércio-meio ambiente, que têm peso crescente na agenda internacional e que já começam a ter consequências econômicas concretas.
Tudo indica que as iniciativas e oportunidades de diálogo com as ONGs internacionais tenderão a aumentar no futuro próximo. Esse é apenas um aspecto —porém de crescente relevância— da ação que será desenvolvida nos próximos anos sob o novo enfoque traçado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em relação a essas organizações.

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