São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
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Governo quer acordo para reduzir importação

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo pretende reduzir a importação de carros prevista para este ano, mas de forma negociada com a indústria. O governo quer garantia de que produção interna será elevada e que não haverá aumento de preço do carro nacional.
Por isso, as medidas de contenção de importação deverão ser tomadas no âmbito da câmara setorial da indústria automobilística, de modo que acordos possam ser formalizados.
O governo decidiu tomar providências não tanto por causa das importações feitas no ano passado (em torno de 180 mil carros), mas por causa das previsões para este ano, 450 mil veículos.
O governo se assustou com o fato de que os fabricantes nacionais planejavam importar nada menos que 300 mil automóveis. Isso seria uma sinalização de que importar acabaria sendo mais negócio do que produzir aqui. A consequência seria fechamento de fábricas e perda de empregos.
Outro fator de inquietação foi o peso dos automóveis na conta de importações, especialmente neste momento em que o governo quer evitar déficit no comércio externo.
Há duas possibilidades em estudo: aumentar o imposto de importação (hoje de 20%) ou estabelecer quotas. O aumento de imposto é a alternativa preferida pelo governo.
Alguns representantes da indústria automobilística vinham reivindicando as quotas, segundo o modelo argentino. Os importados são limitados a 10% do total de veículos vendidos. E quem produz e exporta carros pode importar com imposto menor, de 2%. Quem é só importador paga 18%.
Mas a equipe econômica não aprecia esse tipo de controle. É burocrático, exige administração pesada para a concessão das quotas e abre espaço para corrupção.
A equipe prefere o aumento de imposto, mais simples e que pode ser aplicado de imediato. Pelos acordos do Mercosul, o imposto de importação de carros precisa chegar a 20% só no ano 2.004.
O Brasil havia se antecipado, no final do ano passado, reduzindo a alíquota de importação para 20%. O objetivo, então, era combater o ágio no carro popular e pressões por aumento de preços internos.
Funcionou. O ágio começou a cair e a simples possibilidade de maior oferta fez cair o preço dos carros nacionais médios e de luxo.
O aumento da alíquota para os anteriores 35% tende a produzir efeitos inversos. Em primeiro lugar, sobe o preço dos importados, com consequente redução da demanda. E abre espaço para a elevação de preço do carro nacional.
É o que o governo quer impedir através de acordos na câmara. Mas qualquer que seja a decisão, haverá uma clara mudança de política.
O núcleo original da equipe econômica do real, formado por Pedro Malan, Pérsio Arida, Edmar Bacha e Gustavo Franco, nunca gostou de aplicar controles administrativos ou políticos sobre o mercado. Achava que isso não funciona.A idéia básica da equipe original sempre foi abrir o mercado e deixar que ele funcionasse, impondo a competição.
Esse era o caminho para impedir elevação de preços e forçar a indústria nacional a buscar maior competitividade. Bacha, hoje presidente do BNDES e um dos principais formuladores do Real, dizia que a indústria automobilística é um cartel que se acertava com outro cartel, o sindicato de trabalhadores, e impunha preços e produtos ao consumidor.
Por isso mesmo, a equipe econômica original não estimulou as câmaras setoriais. Ao contrário, colocou-as na geladeira.
A crise do México contribuiu para a mudança de política. Deu força aos membros que se agregaram à equipe econômica, como José Serra, ministro do Planejamento, e Dorothéa Werneck, ministra da Indústria e Comércio, uma entusiasta da câmara setorial.
Para esses novos membros, a idéia de proteger a indústria nacional é positiva. Assim, a restrição à importação de automóveis será um precedente importante. Os mesmos argumentos, conter déficit e defender empregos, valem para a indústria têxtil, para a eletrônica e assim por diante.
A mudança será significativa porque todos os índices de preços mostram que a importação está segurando a inflação. Os itens que mais sobem são justamente aqueles que não podem ser importados, como serviços e aluguel.
Ou seja, na questão dos carros importados, o governo estará mexendo em parte essencial do plano.

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