São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
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NA PONTA DO LÁPIS

MARCELO LEITE

Com as muitas manifestações de leitores sobre a coluna de 1º de janeiro, "Afogando em números", decidi criar um espaço similar ao rodapé "Na Ponta da Língua", só que para comentar problemas relacionados com quantidades. Pretendo alterná-los ou publicá-los simultaneamente, ao sabor dos desgostos jornalísticos.

Para a inauguração, nada melhor do que uma enxurrada de estatísticas.
Como o leitor pode ver no quadro anexo, o número de atendimentos continua alto, 1.328 (no bimestre outubro/novembro, tinham sido 1.483). Uma centena e meia de contatos a menos, mas de todo modo uma diminuição menos acentuada do que esperava, por causa das festas de fim de ano e das férias de janeiro.
(Para termo de comparação, cito o número de leitores atendidos durante todo o ano de 1994 pelo ombudsman do jornal barcelonês La Vanguardia, Roger Jiménez: 740.)
Caiu a proporção de queixas relacionadas com fascículos e assinaturas, que caracterizam um desvio de função (a alçada do ombudsman se restringe à Redação). De cerca de um terço (477 em 1.483) no bimestre anterior, passaram para menos de um quarto (311 em 1.328).
Chama a atenção o contingente de demandas referentes aos fascículos (208), sem dúvida uma iniciativa que mexe com os leitores. Como qualquer um pode desconfiar, a grande maioria das pessoas não procura o ombudsman exatamente para elogiar.
Considere o exemplo do Atlas. Mesmo tendo sua distribuição encerrada em 18 de dezembro (antes da metade do bimestre quantificado), foi o campeão, com 97 manifestações. Em geral, queixas sobre o sistema de encadernação montado pela Folha: via Correios para quem mora fora da Grande São Paulo, em bancas nos supermercados Pão de Açúcar para os grão-paulistanos.

Apesar dos problemas e transtornos que causaram para muitos leitores, ninguém pode questionar o espantoso aumento de tiragem obtido com os fascículos da Folha, de 46,6%, entre janeiro e dezembro de 1994.
O jornalista que fizer pouco deles provavelmente será movido por despeito. Por outro lado, o jornalista que não atentar para a mensagem dos números estará também incorrendo em erro.
Ao noticiar seu feito, domingo passado, a Folha compreensivelmente deixou de destacar um dado interessante: depois de elevar de forma consistente sua circulação média a partir de agosto, quando foi lançado o "Atlas", o jornal observou uma queda de novembro (média de 719.285 exemplares diários) para dezembro (687.354).
Tal diminuição deve ter algo a ver com o término da coleção do "Atlas". Acredito também, com base no grau de irritação manifestado por muitos leitores, que os fascículos perderam algo de seu "glamour" graças a quatro fatores negativos, além do esgotamento do efeito novidade:
1. O lançamento do menos entusiasmante "Conhecer por Dentro";
2. A obrigatoriedade de adquirir a capa dura do novo fascículo (que circulou com o último do "Atlas");
3. O acréscimo de preço de 50%, naquele 18 de dezembro;
4. A distribuição de "500 Receitas" apenas para leitores da Grande São Paulo.
É esse o recado que tenho ouvido, aqui.

As porcentagens continuam infernizando a vida dos jornalistas da Folha. E de seus leitores.
Na quinta-feira, o caderno Dinheiro trazia em sua pág. 2-2 o título "Inadimplência chega a 98% e é recorde". Mesmo sem saber do que se tratava, fiquei desconfiado e curioso para saber em que setor só 2% dos devedores cumpriam com suas obrigações.
Matei a charada logo no lide (do inglês lead, conduzir), nome dado por jornalistas ao primeiro parágrafo de uma notícia. Na realidade, o número de inadimplentes no comércio paulista tinha aumentado 98,4%. Segundo o jornal, passara de 57.602 em janeiro de 1994 para 114.376 no mesmo mês de 1995.
Primeiro e óbvio erro: confusão. Em nenhum ponto da reportagem se informa qual é a proporção de inadimplentes em relação ao universo de compradores. Se parasse para pensar, o que nem sempre é possível ou habitual numa Redação, o próprio autor do título perceberia o absurdo.
Segundo erro, mais sutil: imprecisão. Na minha calculadora, obtive 98,562% (e mais uns quebrados). Arredondado, esse valor fica em 99%. Ou seja, um ponto percentual de erro no que foi informado pelo título —mesmo abstraindo sua inadimplência em matéria de bom senso.

Cartas devem ser enviadas para a al. Barão de Limeira, 425, 8º andar, São Paulo (SP), CEP 01202-001, a.c. Marcelo Leite/Ombudsman, ou pelo fax (011) 224-3895. Para contatos telefônicos, ligue 0800/159000 entre 14h e 18h, de segunda a sexta-feira.

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