São Paulo, domingo, 5 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Subida dos juros nos Estados Unidos é inútil

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Pela sétima vez o Fed, banco central dos EUA, elevou as taxas de juros. A justificativa é sempre a mesma: evitar que o crescimento excessivo gere pressões inflacionárias. O que pouco se discute é a própria história da política monetária norte-americana, a demonstração cabal de que a alta de juros é algo inútil.
Nos 43 anos entre 1950 e 1992 o índice de preços de bens de consumo (o IPC) dos EUA passou de 24,1 para 142. Houve apenas um ano em que houve deflação, ou seja, queda de preços: 1955. Foi a única oportunidade, em 43 anos, em que os preços deixaram de subir e, mesmo assim, a queda foi de 26,9 para 26,8. Não custa aliás lembrar que, justamente nesse ano, a taxa de juros caiu. É óbvio que o banco central norte-americano fez ao longo de todos os outros anos feito o máximo de esforço para evitar a inflação.
Em 1950, o gasto com juros na empresa média americana era 1,6% dos gastos com salários. Em 1990 essa proporção já era de 11,8% (apesar do crescimento notório, ao longo desses anos, das folhas de pagamento dos executivos americanos).
O argumento central a favor da alta dos juros é conter o aquecimento econômico excessivo. Mas elevar juros significa sufocar o investimento, ou seja, impedir a ampliação da capacidade produtiva.
Basta que exista alguma defasagem entre a alta dos juros e a queda do consumo para que ocorra, na prática, um estrangulamento ainda maior da economia. Mais consumo, com investimentos em queda, é sinônimo de "excesso de demanda", e portanto inflação. O oposto do que se desejaria com a alta dos juros.
Como diria Keynes, chega-se a uma situação em que há não apenas uma escassez de nova capacidade produtiva, mas também um desestímulo ao uso da capacidade existente. George P. Brockway, que apresenta essas considerações no número de outono de 1994 do Journal of Post Keynes, na Teoria Geral, onde ele usou um ponto de exclamação. Era a conclusão heterodoxa de que "o remédio para o boom não é uma alta mas sim uma redução dos juros!".
O debate nos EUA, nos bastidores da questão de juros, gira em torno de uma hipótese econômica tão metafísica quanto a crença na transmigração das almas: a doutrina da taxa natural de desemprego.
Alguns definem uma taxa de desemprego como um parâmetro trans-histórico de equilíbrio no uso do recurso força de trabalho. É a doutrina da "taxa natural" que fundamenta os esforços do Fed para frear a economia dos EUA.
Mais que a crença num desemprego natural, está em jogo a hipótese de que na presença desse desemprego saudável nenhuma política econômica é eficaz. Os mais conservadores acreditam numa taxa mais alta, enquanto os mais liberais estão disposto a esperar que o desemprego diminua mais. Willian R. Kenan, no mesmo número do IPKE, informa que a faixa situa-se entre 5,5 a 7%.
Tudo isso não passaria de detalhes acadêmicos, não estivessem os latino-americanos e outros afetados pela crise mexicana e dos mercados emergentes no rastro da alta dos juros norte-americanos. É apenas metafísica, mas o estrago é bem concreto. Acredite, se quiser.

Texto Anterior: EM RESUMO
Próximo Texto: Fronteira guarda sinais de ocupação
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.