São Paulo, quarta-feira, 8 de fevereiro de 1995 |
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Sostiene Pereira
CARLOS HEITOR CONY RIO DE JANEIRO — Antonio Tabucchi traduziu Fernando Pessoa e Drummond para o italiano. Não estou a par de sua biografia, mas sei que, por qualquer motivo que não compreendo, é ligado ao mundo português. Escreveu agora um best-seller, "Sostiene Pereira -Una Testimonianza", ignoro se já foi traduzido, mas é do conhecimento geral que virou filme com Marcello Mastroianni no papel-título.O enredo é banal: em 1938, um jornalista de meia idade aceita fazer a página cultural de um modesto jornal português. É um homem solitário, católico com algumas dúvidas e apolítico. Aceita como colaborador um jovem que se envolve no recrutamento de voluntários para a Brigada Internacional que luta na guerra civil espanhola. A polícia portuguesa assassina o rapaz, Pereira consegue furar a censura do governo e a do próprio jornal, publica uma nota sobre o crime da polícia salazarista. Com um passaporte falso que encontra nos pertences do morto, se manda para a França, onde se asila. O relato é frio, compacto, garantindo a cada lance que Pereira "sostiene" a sua versão, ou melhor, a sua verdade. De um lado, o autor aboliu o narrador omnisciente, de outro, a fragmentação dos pontos de vista dos diversos personagens. Nem Balzac nem Pirandello. O encanto do romance está em sua espontaneidade. Tabucchi seria assim uma espécie de oposto a Umberto Eco, o autor italiano mais badalado no momento. Ficaria mais próximo a Cesare Pavese e Italo Calvino. Contando uma história sem artifícios de linguagem ou técnica, ele consegue criar um clima de manso terror à maneira de Dino Buzzati, um comprometimento político sem sectarismo e até mesmo com uma boa dose de ironia, como Ignazio Silone. Pela sucessão de autores aqui citados, dou a impressão de que Tabucchi é um "blended" da moderna literatura italiana. Mais do que uma síntese: um exemplo de que o jornalismo, com seu apelo ao imediato, seu compromisso com o efêmero, pode se tornar literatura. E também mais do que isso: uma obra de arte. Texto Anterior: ABC da cidadania Próximo Texto: Piruetas Índice |
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