São Paulo, quinta-feira, 23 de fevereiro de 1995
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Reação ou conivência

JANIO DE FREITAS

A falta de meios legais, invocada pelo ministro Sérgio Motta, para não anular a enxurrada de concessões de telecomunicações assinadas por Itamar Franco nos seus últimos cinco dias de governo, não se sustenta ante a informação de que o maior beneficiário das concessões foi o próprio ministro das Comunicações de então, Djalma Morais.
Se Morais, que assinou os decretos de concessão com Itamar Franco, praticou autofavorecimento valendo-se do cargo que detinha, incorreu em crime e seus atos são revogáveis. Na pior hipótese, poderiam ter a vigência suspensa até sua apreciação pela Justiça, caso o governo optasse pelos procedimentos judiciais. Injustificável é que o governo se mantenha passivo, atitude que passa da complacência à conivência, na suposta espera de que o Congresso aprove ou não a proposta do deputado Tilden Santiago de anulação parlamentar das concessões.
Os procedimentos judiciais até independem de que Djalma Morais seja o sócio oculto da empresa que, com capital de apenas R$ 3.000, ganhou 41 concessões. Mesmo que o governo não houvesse constatado —como afirma o repórter Luis Cláudio Cunha que aconteceu— a vinculação material do então ministro com os atos que assinou, a outorga de 349 concessões ao fechar-se a cortina de um governo é, por si só, de imoralidade evidente. Este, aliás, não é um caso que exija ação só do Ministério das Comunicações. A Procuradoria-Geral da República tem a mesma obrigação.

O poderoso
O governo está mais nas mãos do senador José Sarney do que nas da maioria dos seus integrantes. Clara demonstração disso está na probabilidade de votação no Congresso, até meados de março, para recusa ou aceitação do veto de Fernando Henrique ao aumento do salário mínimo de R$ 70 para R$ 100.
O esquema articulado pelo governo teve o objetivo de protelar a apreciação do veto presidencial, de maneira a que afinal não acontecesse. Com o reajuste obrigatório do mínimo em maio, a apreciação protelada se tornaria dispensável. E, com isso, estaria eliminado o risco (alto) de derrota de Fernando Henrique.
Como presidente do Congresso, porque presidente do Senado, Sarney já prometeu ao deputado Paulo Paim, e depois a outros, fazer a inversão da pauta de votações para submeter o veto a apreciação em futuro próximo. Se o fizer, destrói o esquema protelatório do governo. Para não o fazer, dispõe de boa arma com que levar o governo a permutas do seu interesse.
E assim será com frequência. O que não implicaria maior problema se Roseana Sarney não fosse governadora do Maranhão, pretendendo inúmeras ajudas federais, e o próprio Sarney não tivesse aspirações a retornar à Presidência da República. Mais engraçado nisso é que, mesmo com seus fortes motivos para presidir o Congresso muito em função da sua política pessoal, foi apoiado por Fernando Henrique para conquistar seu novo cargo contra Pedro Simon, que não é de manobras.

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