São Paulo, quinta-feira, 23 de fevereiro de 1995 |
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Vícios à solta Apesar de o Congresso Nacional ter conseguido aprovar, anteontem, um pacote de medidas provisórias na tentativa de desobstruir a sua pauta e assim abrir caminho para a votação das emendas constitucionais, os vícios que marcaram a atuação de muitos políticos ainda permanecem no Legislativo. O empreguismo vai muito bem. O senador Odacir Soares (PFL-RO), primeiro-secretário da Casa, vai propor à Mesa Diretora a votação de um projeto seu que pode criar até 486 cargos de confiança nos gabinetes dos senadores. O projeto não implica custos adicionais para o Estado. A verba hoje gasta com os salários de quatro assessores para cada gabinete (R$ 13,3 mil) poderia ser gasta com a contratação de até dez funcionários, a critério de cada senador. Políticos precisam de empregos como o homem precisa do oxigênio. Não importa a qualidade de seus próprios assessores —diretamente proporcional ao valor do salário oferecido. Dar emprego rende votos e é isso o que importa. Num episódio bem mais gritante, o nepotismo mostrou que habita o Senado e não vai abandonar o seu lar. Um exemplo: o senador Gilvan Borges (PMDB-AP) admitiu, despudoradamente, que contratou a sua mulher e a sua mãe para trabalharem em seu gabinete. Sem nenhum resquício de vergonha, o parlamentar ainda tenta justificar seu ato de um modo singelo: "Uma dorme comigo e a outra me pariu". Em seus malabarismos para tentar justificar o que é injustificável, Borges apelou até para as Escrituras: "A Bíblia diz que o homem deve honrar o pai e a mãe para que a sua vida se prolongue na terra. Se pudesse daria dez empregos à minha mãe". O senador poderá viver muito. Se o projeto de seu colega for aprovado, ele poderá realizar o seu sonho de dar para a mãe um emprego que vale por dez. Essa legislatura tem pela frente o duríssimo desafio de aprovar mudanças constitucionais, encaminhar dezenas de legislações complementares, fazer leis ordinárias e resgatar a imagem do Legislativo já fortemente combalida. Começou portanto mal neste último ponto. Texto Anterior: Mais recuo Próximo Texto: Quem tem não paga Índice |
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