São Paulo, segunda-feira, 27 de fevereiro de 1995
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Privatização no Brasil é falha, diz consultor

ANTONIO CARLOS SEIDL
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

A privatização no Brasil não é para valer. A atitude do governo Fernando Henrique Cardoso, na questão, lembra mais a hesitação do primeiro-ministro britânico John Major nas atuais discussões para a desestatização das ferrovias e correios do Reino Unido do que a firmeza da ex-premiê Margaret Thatcher, que colocou a palavra privatização nos dicionários.
A opinião é de Peter Benson, presidente do grupo de privatização internacional da empresa de consultoria britânica Coopers & Lybrand, líder do ranking mundial de privatização, de acordo com a publicação especializada "Privati sation International". A Coopers & Lybrand participa da privatização de 385 empresas em 67 países (ver quadro nesta página).
O grupo é responsável atualmente pela privatização da Deutsche Telecom, a empresa de telecomunicações da Alemanha, a maior privatização de todos os tempos, cuja oferta pública de ações no valor total de US$ 19,2 bilhões está prevista para outubro de 1996.
Em entrevista à Folha na sede mundial da empresa em Londres, no início do mês, Benson se disse "decepcionado" com o processo de privatização no Brasil.
"Apesar do incontestável sucesso nos setores siderúrgico e petroquímico, o governo não parece ter a necessária e indispensável determinação para levar o processo de privatização até o fim", disse.
Com experiência de privatização em 67 países, Benson não hesita: "o Brasil deveria se preparar para a quebra do monopólio do setor de telecomunicações".
"Nenhum governo terá recursos para acompanhar o crescimento exponencial que se avizinha na indústria mundial de telecomunicações", disse. "Basta observar o exemplo da Alemanha".
Para Benson, o principal obstáculo à privatização no Brasil é a falta de vontade política do governo. "A vontade política é importante porque a privatização enfrenta toda sorte de barreiras, tais como funcionários públicos e ministros, que não querem abrir mão do poder, sindicalistas, que têm medo da perda de empregos, e os administradores das empresas públicas, que querem manter seus privilégios", afirmou.
Segundo Benson, no Reino Unido, a privatização do setor de telecomunicações permitiu queda real de 40%, em média, das tarifas telefônicas, com uma melhoria imensurável da qualidade e do nível tecnológico dos serviços.
Para Benson, a melhor maneira de se medir o sucesso de um programa de privatização não é, como se pensa normalmente, o valor total das vendas das estatais ao setor privado.
No Reino Unido, disse, o governo obteve, nos últimos 15 anos, cerca de US$ 90 bilhões com a privatização. Mas para Benson, o principal resultado só é sentido a longo prazo.
Ele cita, como exemplo, o caso da BT (British Telecom). "Até a privatização, a BT tinha baixa rentabilidade ou dava prejuízo, consumia subsídios, não investia em tecnologia e não pagava impostos", disse. Agora, a BT paga impostos de US$ 1,6 bilhão por ano, e com a quebra do monopólio compete com outras empresas que chegaram ao mercado.
A longo prazo, o aumento da receita tributária, o fim dos subsídios a empresas deficitárias e "inchadas" e a melhoria da eficiência geral da economia são os verdadeiros benefícios da privatização.

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