São Paulo, quarta-feira, 1 de março de 1995
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FHC no Chile _uma amizade profunda

HERALDO MUÑOZ

FHC no Chile —uma amizade profunda
Hoje, o presidente Fernando Henrique Cardoso inicia sua primeira visita oficial ao exterior, viajando ao Chile. Tal visita reflete simbolicamente a importância que o Chile tem na vida do presidente e de sua esposa Ruth Cardoso. Para os chilenos, esta visita de FHC não só é uma grande honra como também um genuíno agrado, pois o presidente do Brasil goza do apreço pessoal de um grande número de líderes políticos —incluindo o do próprio presidente do Chile, Eduardo Frei—, com os quais conviveu durante vários anos de exílio no Chile.
Mais ainda, o público chileno, que tradicionalmente sente uma forte simpatia para com a nação brasileira, vê com particular interesse a visita desse presidente "meio chileno" e de vários de seus ministros que consideram o Chile como sua segunda pátria.
Mas, além disso, hoje em dia existem coincidências substantivas entre os projetos de governo dos dois países e a relação bilateral, no contexto do Mercosul, transformou-se para ambos em uma vinculação de primeira prioridade.
No plano dos projetos políticos, o Chile e o Brasil têm percorrido caminhos paralelos. A partir dos anos 60, tentamos construir sociedades mais desenvolvidas, livres e justas. Definitivamente, buscamos introduzir as mudanças sociais e econômicas que nossas maiorias nacionais demandavam.
Por diversas circunstâncias e em momentos diferentes, ambos países sofreram graves colapsos de suas instituições democráticas. Por longos anos, vimos frustrada nossa aspiração comum de lograr um crescimento econômico com equidade.
Nos tempos difíceis do autoritarismo, chilenos e brasileiros soubemos dar-nos as mãos em solidariedade e, mais tarde, ter a suficiente maturidade para refletir juntos e aprender dos erros. Assim, pudemos recuperar nossas democracias e reiniciar nossos respectivos caminhos e tendo presente as profundas transformações que haviam experimentado nossas sociedades e a economia política mundial.
Nesta perspectiva, o Brasil atualmente está empenhado em impulsionar um modelo muito parecido ao que o Chile vem executando nos últimos anos. O propósito principal em nossos dois países é incrementar a competitividade externa e interna baseados na abertura e desregularização da economia e as privatizações. Igualmente, o projeto de governo em ambos países inclui reformas ao sistema tributário, previdência social, práticas trabalhistas e modernização do serviço público.
Mas, junto a tudo isso, os projetos chileno e brasileiro aponta à eliminação da pobreza e das inequidades sociais através dos investimentos em educação, saúde, habitação e, especialmente, na criação de empregos. A idéia é que sem crescimento e estabilidade não haverá maior equidade e, sem esta, não haverá uma democracia estável nem um crescimento econômico sustentável.
O ponto fundamental é que não pode coexistir a pobreza com o aumento da riqueza. Este é não somente um problema ético-político, mas também econômico, especialmente numa economia mundial em que a qualidade dos recursos humanos é um fator chave para a concorrência internacional.
Além dos projetos de governo coincidentes, Chile e Brasil estão unidos por uma sólida relação econômica bilateral que atingiu US$ 1,6 bilhão em 1994. O Brasil exportou 1 bilhão de dólares ao Chile em 1994. Do ponto de vista chileno, o Brasil é o parceiro número três do Chile em nível mundial. De modo similar, com o recente processo de abertura da economia brasileira, foram materializando-se importantes investimentos diretos de empresários chilenos no Brasil, enquanto que o clima de abertura ao capital estrangeiro no Chile atraiu significativos investimentos brasileiros na mineração, construção, negócios bancários e siderurgia.
Sem dúvida, a importância do Brasil para o Chile é ainda maior no contexto da aproximação do Chile ao Mercosul. O Brasil e a Argentina são, respectivamente, o terceiro e o quarto sócio comercial do Chile. Mais ainda, entre 1990 e 1993 as exportações chilenas —especialmente as manufaturas— ao Mercosul aumentaram em 67%. Por outra parte, cabe fazer notar a relevância comercial do Chile para os países do Mercosul.
O fluxo do comércio só da Argentina e do Brasil com o Chile é de US$ 2.850 milhões, o que representa um terço do intercâmbio total dos países membros do Mercosul entre si. Por outro lado, a importante orientação diplomática, geográfica e comercial do Chile aos mercados da Ásia-Pacífico pode ser também de grande utilidade para a projeção do Mercosul em direção a esses mercados.
O governo do presidente Frei propôs aos países do Mercosul um projeto de associação. Pese a manter razões importantes para não ingressar ao Mercosul de maneira plena —pois o Chile possui taxas aduaneiras mais baixas e uniformes do que a tarifa externa comum e a existência de assimetrias em matéria de políticas macroeconômicas.
Tanto a maior ênfase nas relações com a América Latina na política exterior do governo Frei como a crescente relevância econômica e política dos países do Mercosul para o Chile levaram à busca de uma fórmula "imaginativa" de associação, ainda que isso não implicasse um ingresso propriamente dito. A proposta do Chile inclui não só um programa de liberalização de bens, mas também a criação de uma maior interdependência entre a economia chilena e as do Mercosul em áreas tais como serviços, infra-estrutura, integração energética e cooperação científica e tecnológica.
A visita do presidente FHC ao Chile deverá significar um forte impulso político às negociações em curso em Montevidéu para concretizar em curto prazo a criação de um espaço econômico ampliado entre o Chile e o Mercosul.
Em suma, além da amizade dos presidentes Cardoso e Frei e suas trajetórias similares, existem entre o Chile e o Brasil esperanças, afetos e interesses concretos compartilhados que marcam a época que se está iniciando como uma era de uma relação especial entre ambos países, seus líderes e respectivos povos.

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