São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
Texto Anterior | Índice

Águas "municipais" e "estaduais"

PAULO MALUF

A quase totalidade das fotos publicadas nos jornais e as imagens transmitidas pela televisão após as fortes chuvas deste início de ano revelam que o problema mais agudo e mais sensível das enchentes em São Paulo localiza-se em torno das marginais, em especial do rio Tietê.
Entretanto, quem for consultar as coleções dos jornais dos últimos dez ou 15 anos verá que o mapa das inundações era muito mais amplo. Toda a zona cerealista, incluindo o mercado central e passando pelos bairros do Cambuci e do Ipiranga, ficava em baixo d'água por causa das enchentes do rio Tamanduateí, causando enormes prejuízos aos comerciantes e atacadistas.
As tradicionais enchentes do Tamanduateí foram eliminadas quando o rio foi canalizado, de maneira cientificamente correta, durante minha gestão como governador, sendo então Reynaldo de Barros prefeito da capital. Há anos que me dedico, não apenas como administrador, mas também como engenheiro, a buscar soluções sérias para este flagelo que a população sofre a cada época de chuvas.
Desde que assumi a prefeitura, em janeiro de 93, esta administração municipal foi a que mais investiu para a solução deste problema, principalmente nas áreas da periferia.
Canalizamos os córregos do Morro do S (atual avenida Carlos Caldeira Filho), Ipiranga (avenida Ricardo Jafet e Museu do Ipiranga), Zavuvus (avenida Alberto de Zagotis), Jaguaré (avenida Escola Politécnica), Uberaba, Uberabinha (avenidas Hélio Pelegrini e dos Bandeirantes) e Mongaguá (avenida Milene Elias), com sucesso total e sem mais inundações nessas áreas. Ainda neste ano de 95 estamos trabalhando nas obras dos córregos de Águas Espraiadas (Brooklyn-Campo Belo) e de Jacu-Pêssego (zona leste da cidade, que ligará Iguatemi-Itaquera-São Miguel Paulista à rodovia dos Trabalhadores). Com recursos próprios e do BID, num total de US$ 550 milhões, canalizaremos mais 13 dos maiores córregos da cidade, como o Mandaqui, Itaquera, dos Machados, da Paciência, Cabuçu de Baixo e Cabuçu de Cima, Aricanduva e outros.
Até o final de meu mandato, a prefeitura investirá R$ 1 bilhão em obras contra enchentes, que será o maior investimento da história da cidade.
Essas obras, porém, só surtirão o efeito desejado —o fim das enchentes— quando o governo do Estado concluir o rebaixamento da calha do rio Tietê.
O paradoxo técnico explica-se da seguinte forma: quanto mais a prefeitura da capital for eficiente na canalização dos córregos, maior será a velocidade das águas que chegam aos rios Tietê e Pinheiros. Isto sempre foi assim nas épocas de chuva, mas acontece que o crescimento da cidade suprimiu as áreas de várzea: quem verificar fotos antigas de São Paulo, verá que áreas onde hoje estão o parque Anhembi e o Campo de Marte, por exemplo, faziam parte da região de retenção das águas.
A cidade espremeu o rio, que hoje cobra seu preço, tornando as obras de canalização mais caras e complexas. A canalização do rio Aricanduva, por exemplo, exigirá quatro bacias de retenção de água, os chamados "piscinões", para que quando ocorrer um volume de chuvas como o dos últimos dias —o maior em 50 anos— a velocidade das águas em direção ao Tietê seja menor.
É natural que para a população esta divisão administrativa entre "águas municipais" —as dos córregos— e "águas estaduais" —as do Tietê e Pinheiros—, não faça a menor diferença na hora em que se fica preso no congestionamento ou quando se tem que abandonar o carro no meio da inundação. Mas a realidade é esta. A prefeitura está fazendo tudo a seu alcance, na esfera de sua competência, efetivamente erradicando as enchentes como no Pacaembu, através do "piscinão", que já livrou aquela área de inundações que eram crônicas.
O governador Mário Covas, ex-prefeito de São Paulo e também engenheiro da Escola Politécnica, conhece bem o problema e se propõe a solucioná-lo. Conseguiu do presidente da República o aval da União para um empréstimo destinado à conclusão do rebaixamento da calha do Tietê. Agindo corretamente, prefeitura e governo do Estado poderão minorar em muito um problema que é mundial. Veja-se o que aconteceu recentemente na Holanda e até nos Estados Unidos.
Acredito plenamente nos projetos tecnologicamente aprovados e na ação do governo do Estado e da prefeitura para, em conjunto, tentar resolver a parte crucial deste problema.

PAULO SALIM MALUF, 63, é prefeito de São Paulo. Foi deputado federal pelo PDS de São Paulo (1983-86), prefeito de São Paulo (1969-71) e governador do Estado de São Paulo (1979-82).

Texto Anterior: A constante carnavalesca
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.