São Paulo, quarta-feira, de dezembro de
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AVIS RARA

MARIA ESTER MARTINHO

"Sempre tive sorte com filmes", admite. "Mas está ficando difícil fazer um trabalho inteligente em propaganda. Quanto mais você faz, mais chega à sutileza. Mas as pessoas que estão ascendendo nas grandes empresas procuram o estereótipo. Por isso está na hora de fazer alguma outra coisa".
A outra coisa ensaia há três anos, quando decidiu abrir caminhos e iniciou um trabalho de prospecção em mercados estrangeiros que deu bons frutos em Buenos Aires e Los Angeles. Ganhou seu Leão em Cannes com um filme para o canal 13 argentino em que sósias de jogadores de futebol conhecidos se preparam no vestiário como se estivessem em um salão de beleza: reclamam do uniforme, fazem as unhas, arrumam o cabelo.
Já Los Angeles é a ponte para a ficção. Meteu a cara na direção de comerciais lá —enfrentando com piadinhas destruidoras a arrogância de algum técnico local— para montar uma estrutura de realização. É a primeira diretora brasileira aceita pelo poderoso Directors Guild of America, o que lhe custou seis meses, entre caça às indicações e audições com a diretoria ("um monte de americanos chatérrimos"). Aceita, entrega 5% de tudo o que ganhar para a DGA —mas só trabalha pela tabela da associação, a melhor do mercado americano, e pode pedir financiamento como diretora. O que está nos planos: acaba de comprar sinopse escrita pelo roteirista David Atkins ("Arizona Dream") a partir de uma idéia sua.
O caminho para o cinema é natural. "Não me considero publicitária, mas fazedora de filmes". O caminho para fora, idem. "No Brasil, a prosperidade gera ódio, a riqueza é associada à corrupção. Acho isso de quinta. Sou uma trabalhadora."
A Califórnia é, por outro lado, o paraíso das figuras ("Lá eu sou básica, corriqueira"), da harmonia entre gays e não-gays e da tecnologia. "Filmei uma cena na praia que tinha uma trucagem de uma latinha que voava", conta. "Quando acabei, o assistente tirou o chassi, entregou pro produtor, que levou num helicóptero, que entregou o material em Hollywood, onde ele foi revelado e enviado, por modem, para a tela do Macintosh, na filmagem. Aí me chamam no monitor para eu ver se tá tudo bem —45 minutos depois de filmado. Absurdo".
O território conquistado e a conquistar tornam merreca os episódios gerados por sua androginia. "Comprei minha liberdade de ser como sou", diz Flavia. "Não tenho que dar explicação". Por isso, evita ir ao banheiro em locais públicos —já foi expulsa de toalete feminino— e tenta chamar a menor atenção possível em ambientes predominantemente gays e masculinos. "As bibas me adoram", se diverte. "É um problema".

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