São Paulo, quinta-feira, 9 de março de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ONGs rejeitam texto 'liberal'

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL

A maioria das ONGs (organizações não-governamentais) decidiu rejeitar o documento final da Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Social. Elas não aceitam a ênfase, que consideram excessiva, colocada no livre mercado.
Ontem à noite, as ONGs estavam tentando fechar o documento de rejeição ao texto oficial, no qual dirão que "não podem apoiar o princípio básico do documento endossado pelos governantes".
Uma das ONGs que recusam apoio ao documento da Cúpula é o Ibase (Instituto Brasileiro de Análise Social e Econômica), dirigido pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, também membro do conselho do Programa Comunidade Solidária do governo Fernando Henrique Cardoso.
A essência da crítica das ONGs, já antecipada pela Folha, é esta: "A superconfiança em forças de mercado livre e aberto, como base para organizar as economias nacionais e internacionais, contradiz nossa visão de que tais forças estão agravando em vez de aliviando a presente crise social global".
O problema das ONGs é que elas sabem contra o que são, mas não o que apóiam."Não pretendemos procurar um novo modelo universal. É uma questão de inovar e desenhar respostas locais para as necessidades de cada país", diz o esboço do contra-documento.
O texto oficial da cúpula de fato coloca toda a ênfase do crescimento econômico no livre funcionamento dos mercados, mas não deixa de fazer reparos.
Diz que a pobreza, a falta de empregos produtivos e a desintegração social, além de "uma ofensa à dignidade humana", são "uma manifestação da ineficácia do funcionamento dos mercados e dos processos e instituições econômicos e sociais".
A crítica das ONGs é compartilhada por outros tipos de entidades humanitárias, que as formulam diretamente no plenário da conferência. Caso, por exemplo, do grupo Médecins du Monde (Médicos do Mundo), com sede na França.
Seu presidente, Bernard Granjon, criticou ontem "a lógica desumana de uma economia que faz pouco do desenvolvimento social."
Granjon foi além. "Não tenhamos medo de abrir os olhos: o desenvolvimento técnico espantoso registrado nestes últimos decênios e a melhoria econômica que ele induziu de uma forma muito desigual desembocaram, hoje, em um total impasse".
Até mesmo o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) critica o documento oficial, mas por outro ângulo. Stephen Lewis, representante do diretor-executivo do órgão, diz que a falta de metas específicas para eliminar a pobreza equivale a uma "delinquência moral".
Acrescenta Lewis: "Este documento deixa a cada país lidar com a pobreza. Mas sem metas isso não vai acontecer". O Unicef defendia que a Cúpula fixasse como objetivo reduzir a pobreza à metade em dez anos e eliminá-la por completo até o ano 2020.
(CR)

Texto Anterior: Mergulhadores causam incidente
Próximo Texto: Programa ajuda meninas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.