São Paulo, quinta-feira, 9 de março de 1995
Próximo Texto | Índice

E o xerife piscou

A instabilidade atual nos mercados financeiros exige nervos de aço. Os movimentos especulativos ainda predominam depois de anunciado o novo regime cambial, numa autêntica queda de braço entre o Banco Central e os mercados.
Há algumas semanas dizia-se que Argentina e Brasil eram bem diferentes do México. Agora já não é tão fácil distinguir a Argentina, em meio aos apelos do presidente e do outrora confiante Cavallo para que a população não compre dólares para colocar debaixo do colchão.
No Brasil, sempre se apontou o estoque de reservas internacionais como a garantia maior de estabilidade cambial. Entretanto, justamente após a redefinição do regime cambial o Banco Central deu a entender que estaria pouco propenso a perder reservas. Entre os indícios dessa disposição implícita está, em primeiro lugar, a enorme discrepância entre as estimativas de dólares que o BC anuncia ter vendido na terça-feira à vista e as que circulam pelo mercado —de US$ 300 milhões, diz o BC, a mais de US$ 1 bilhão, noutras versões.
Além dessa incômoda dispersão, que em nada contribui para aumentar a confiança, as tentativas do presidente do BC, Pérsio Arida, de explicar o novo sistema aos agentes também deixaram transparecer que para a autoridade monetária seria melhor preservar o nível de reservas. Como decorrência, interpretou-se que, se há um limite para vender dólares, seria inevitável em algum momento mudar as bandas cambiais. Interpretação apressada, mas que na prática gerou confusão.
O fato é que nos três primeiros dias do sistema de bandas aumentaram a incerteza e, portanto, as pressões de demanda por moeda estrangeira. Ontem o BC fez cinco leilões para conter o dólar.
Os fundamentos para a credibilidade na política cambial brasileira são praticamente os mesmos de antes da introdução do sistema de bandas: um estoque respeitável de reservas, um déficit comercial que tende a cair, um governo empenhado em promover ajustes nas suas despesas. Se o BC relutar em derrubar com maior vigor a especulação do mercado, ou os fundamentos já pioraram além do que se sabe ou as autoridades estão conduzindo mal a transição ao novo regime cambial —o que, aliás, foi fatal na deflagração da crise no México.
Se o Brasil é diferente, no tiroteio o xerife não pode piscar.

Próximo Texto: Manobra suspeita
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.