São Paulo, quinta-feira, 9 de março de 1995
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O México está aqui

ELEONORA DE LUCENA

Depois de tentar escamotear o problema durante meses, o governo acabou reconhecendo o fato na segunda-feira: a crise desencadeada pela falência mexicana é um desastre para o real.
A confissão veio na forma de desvalorização da moeda, anunciada no embrulho do sistema de "bandas de flutuação". Com reservas cambiais em queda, gastos com importação em alta e fuga de capital, a saída foi o Real 2.
O remendo ao plano está tendo um começo tumultuado. Orientações desencontradas e confusas do Banco Central têm provocado tumulto nos mercados. O governo foi obrigado a gastar milhões para evitar uma queda ainda maior do real.
A desvalorização da moeda trouxe instabilidade para as empresas, provocou um turbilhão nos negócios de exportação/importação e acelerou o ritmo das apostas nos mercados de risco. O Real 2 está enterrando a idéia de que o governo de Fernando Henrique Cardoso seria "um processo".
A partir de segunda-feira, a procura por dólar aumentou, as Bolsas não pararam de despencar e o tema reajuste de preço voltou a rondar as mesas dos executivos. Quem saiu na frente foi a Prefeitura de São Paulo, que já acenou com uma alta de 30% no preço das passagens de ônibus municipais a partir de maio.
Colocado contra parede, o governo tenta controlar o mercado. Afirma que a desvalorização foi apenas uma manobra preventiva e que o ajuste feito é suficiente para reverter os problemas do plano. Mas já admite que a inflação de fato vai subir neste mês.
Além da turbulência na economia, o Real 2 já causa estragos na política. Depois de segunda-feira, se acentuaram os protestos contra as propostas oficiais de reforma constitucional. Temas que pareciam obter consenso na bancada de apoio do governo (como a aceleração das privatização e abertura maior ao capital externo) agora estão sendo cercados de dúvidas.
Já a oposição, que parecia varrida do cenário político após a retumbante vitória de FHC no primeiro turno, tenta agora ganhar fôlego com o fantasma do México. Há obstrução no debate das reformas. Frente a tudo isso, o governo adia as mudanças na Previdência e dá sinais de que pode recuar mais nas suas propostas.
Lá fora o ambiente não poderia ser pior. Há um terremoto sem fim nas moedas. O dólar despenca sem parar, também na esteira da crise mexicana. O governo norte-americano, os países europeus, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial despejam montanhas de dinheiro para tentar apagar o incêndio. Até agora sem sucesso.
Os especialistas não têm outra definição para o que está ocorrendo na economia mundial: estamos vivendo uma nova crise de 1929. Uma crise, é claro, com roupa mais moderna, computadorizada, globalizada.
O estopim de tudo isso foi dado pela desvalorização atabalhoada da moeda mexicana. Depois veio a bancarrota das empresas. A Argentina já começou a mergulhar num inferno. O governo de Carlos Menen resiste a mexer no câmbio, de olho na sua (agora problemática) reeleição.
No Brasil o Real 2 só começou na segunda, também com uma desvalorização. Vamos ver no que vai dar.

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