São Paulo, quinta-feira, 9 de março de 1995
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Furtar 'lembrancinhas' também é delito

WALTER CENEVIVA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Para saber se uma certa conduta constitui (ou não constitui) crime é necessário verificar se tal conduta se ajusta ao tipo definido em lei. Parece complicado, mas não é.
Tomemos o exemplo do furto. Furto é o ato de subtrair, de tirar, de levar para si ou para outrem, mas sempre com vontade livre e determinada, coisa alheia móvel. Essa descrição corresponde ao "tipo" de delito, que pode resultar para o delinquente (o ladrão, na linguagem comum) em condenação de um a quatro anos de reclusão, além de multa.
Tem gente que furta cinzeiro de hotel ou talheres de avião (que, na primeira classe e na executiva são, em geral, muito bons). É costume condenável, provocador de sérios aborrecimentos quando descoberto, mas, em geral, não dá cadeia, em primeiro lugar porque a vítima ou não tem como encontrar o autor do prejuízo ou, quando o apanha, prefere resolver a questão na intimidade.
Mesmo na inusitada hipótese de atuação enérgica da vítima, tratando-se de criminoso primário e coisa de pouco valor, o juiz em geral substitui a restrição da liberdade pela multa. Mas, fique claro: a primariedade, nesse caso, é perdida.
Quando o objeto furtado tem expressão econômica maior do que a de "coisa de pequeno valor" em moeda nacional, a questão se complica, pois o magistrado já não tem como amenizar a pena.
Nesse caso ele leva em conta a extensão do prejuízo sofrido pela vítima.
A jurisprudência (ou seja, o conjunto das decisões proferidas pelos tribunais) tem reconhecido que em casos de cleptomania os autores dos furtos são isentos de pena. Todavia, a cleptomania não pode ser apenas alegada. O juiz manda submeter o acusado a uma prova médico-psicológica para verificar se tem condições de se auto-determinar ou se não tem possibilidade de resistir ao impulso de furtar. A cleptomania é um desvio da personalidade, uma doença consistente na irresistível tendência para o furto e, por isso, exclui a criminalidade.
Estas considerações valem para o Brasil e quem quiser saber mais sobre o assunto deve ler no Código Penal os artigos incluídos no título dedicado aos crimes contra o patrimônio, especialmente o artigo 155, que trata do furto. A legislação dos países do mundo ocidental é, como regra, parecida com a nossa. Todavia, atenção: em nações do Oriente Médio e do Extremo Oriente o ladrão pode ser condenado a sofrer um certo número de chibatadas (ainda que a coisa seja de valor inexpressivo) e, em hipótese mais extremadas, a pena vai até à amputação da sua mão direita. Lá não vale a pena arriscar.

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