São Paulo, quarta-feira, 15 de março de 1995
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Tecnologia permite dar duração eterna à curiosidade do homem

BILL GATES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Quando vejo o que a tecnologia está começando a oferecer às crianças, sinto vontade de ser criança outra vez.
As crianças começam a vida com muito talento e curiosidade. Elas têm a tendência natural de querer explorar o mundo e descobrir como se encaixam nele. Elas dedicam uma energia espantosa às coisas que as interessam. Algumas crianças, são capazes de recitar dezenas de nomes científicos malucos de dinossauros.
À medida que vão crescendo, porém, elas vão perdendo sua curiosidade. É uma pena, porque no mundo de hoje uma pessoa que tenha uma mente curiosa pode avançar muito mais.
Quando a criança faz perguntas e elas são respondidas de maneira interessante, ela continua fazendo perguntas. Essa é uma das razões pelas quais a presença de pais e professores atentos e interessados é tão importante.
Mas se o adulto está muito ocupado ou não sabe responder à pergunta, ou se a criança procura num livro que não oferece as respostas, sua curiosidade muitas vezes vai se esvaindo. Quando a curiosidade é frustrada repetidas vezes, pode-se perder o prazer e o incentivo do aprendizado.
Conservei parte da minha curiosidade infantil, mas queria ter conservado mais. Acho que muitas pessoas têm o mesmo sentimento.
Hoje em dia, as crianças do mundo inteiro têm a perspectiva de usar ferramentas que ajudam a manter acesa a chama de sua curiosidade, satisfazendo-a de maneiras profundamente interessantes. Essas ferramentas multimídia estão chegando agora, à medida que as pessoas finalmente descobrem meios de casar os pontos fortes do micro com a enorme necessidade de um ensino melhor.
Um computador multimídia pode usar títulos interativos que combinam texto, desenhos, som e vídeo em movimento. Quando se diz que um título é "interativo", isso quer dizer que é organizado de tal modo que a pessoa que usa o computador pode controlar o que vê e ouve.
Por exemplo, uma menina interessada em saber mais sobre o sistema solar poderia usar um título que lhe permitisse pular para qualquer planeta ou lua que ela quisesse estudar. Ela poderia ver fotos, ouvir narrativas, examinar diagramas e ler detalhes. Se ela não entendesse alguma coisa, por exemplo a diferença entre um planeta e uma lua, poderia procurar e encontrar a explicação.
Para que tudo isso possa funcionar é preciso que grande quantidade de informações esteja disponível quase instantaneamente. Hoje isso se consegue principalmente pelo armazenamento de informações em CD-ROM, que são como os a CDs de música, só que fornecem texto, imagens e vídeo.
Mas dentro de alguns anos a maior parte da informação multimídia será transmitida por redes de informação em alta velocidade, que vão interligar todas as escolas, empresas e muitas residências também. Essas redes, conhecidas como a superinfovia, encerram a perspectiva de transmissão de quantidades virtualmente ilimitadas de informação.
Antigamente havia um preconceito contra os computadores originalmente usados em escolas porque na realidade não eram usados para transmitir conhecimentos, e sim apenas para testá-los. Isso fez os computadores serem vistos sob uma ótica negativa.
Mas quando o micro passa a satisfazer a curiosidade das pessoas e a transformar o aprendizado em processos divertidos, as possibilidades ficam emocionantes.
As crianças curtem a sensação de estar conseguindo sempre mais. Elas têm orgulho quando sabem mais sobre determinado assunto do que um adulto que admiram. O computador pode alimentar essa sensação de conquista, fazendo a criança perceber quanto já aprendeu e incentivando a estudar mais.
Esse incentivo positivo alimenta o desejo de progredir mais. Crianças de três anos podem ser premiadas com surpresas, tipo um personagem que aparece na tela e as aplaude. Elas adoram isso.
Sempre fico impressionado quando vejo criancinhas pequenas brincando com grandes títulos, como a série Living Books, publicada pela Broderbund e Random House. Com um pouquinho só de prática, crianças que mal têm idade suficiente para falar várias sentenças seguidas já conseguem usar o mouse para explorar mundos amigos —clicando aqui e ali na tela, para ver o que acontece.
As ferramentas de multimídia não vão tomar o lugar dos pais ou dos professores, assim como os livros didáticos não tomam. Tampouco vão diminuir a importância da leitura. Mas as imagens e os sons enriquecem o aprendizado tremendamente.
Muitas escolas já têm alguns PCs à disposição dos alunos, e os PCs estão invadindo as residências familiares em números impressionantes. Pesquisas recentes indicam que cerca de um terço de todas as famílias nos EUA têm um PC. Nas famílias que têm filhos adolescentes, metade tem PCs.
Trata-se de um fenômeno mundial. Na Coréia e em Taiwan, por exemplo, mais de um quarto das vendas de PCs são para residências. Hoje, no mundo inteiro, compram-se mais PCs do que automóveis.
Nem todas as famílias têm condições financeiras de comprar um computador, mas com a queda dos preços é possível que um PC acabe custando a mesma coisa que um televisor. Escolas, bibliotecas, escritórios de órgãos do governo e centros comunitários, todos terão computadores em abundância para que ninguém fique sem acesso.
Sou um eterno otimista. Acredito que as crianças que crescem com acesso a esses recursos conservarão mais curiosidade até a idade adulta. Isso francamente me dá um pouco de inveja.
Às vezes recebo cartas de crianças dizendo que quando crescerem querem ser como eu. Mas quando vejo o que será possível nos próximos anos, sinto que queria ser uma criança no mundo de hoje.

Cartas para Bill Gates, datilografadas em inglês, devem ser enviadas à Folha de S.Paulo, caderno Informática, pelo correio —al. Barão de Limeira, 425, 4º andar, CEP 01201-001, São Paulo, SP—, ou pelo fax (011) 223-1644. A correspondência também pode ser enviada diretamente a Bill Gates no endereço eletrônico askbill microsoft.com.

Tradução de Clara Allain

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