São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 1995
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Tímido teste

O sistema que o Ministério da Educação deve implementar para avaliar o ensino universitário de graduação tem o valor de tornar visível a qualidade do produto das fábricas de diploma, muitas delas de "fundo de quintal" e montadas com a chancela do governo federal.
Caso seja de fato adotada, a avaliação servirá para que os usuários de serviços dos profissionais de nível superior e os cidadãos em geral, que sustentam as escolas públicas, tenham melhores condições de saber pelo que estão pagando. O mercado tenderá a restringir-se para as arapucas. Elas podem mesmo vir a ser fechadas, o que no entanto deve demorar ainda algum tempo.
O teste proposto é, porém, apenas um primeiro passo no sentido de melhora do ensino. O governo não pode desincumbir-se de outras atitudes de controle da qualidade. A avaliação incide apenas nas bordas do sistema: ela tende a eliminar os picaretas evidentes, mas não melhora necessariamente os medíocres; qualifica alunos, mas só depois de sua formatura.
O que fazer no caso das faculdades sofríveis que restarem depois da peneira? Especialmente nas universidades públicas, os departamentos medíocres devem ser investigados e as causas do problema devem ser tratadas —através da dispensa de profissionais relapsos.
Um exemplo de que os testes são apenas o momento inicial da reforma é o exame da Ordem dos Advogados. A prova elimina os evidentemente incapazes de exercer a profissão, mas a OAB não exerce influência significativa no mercado de cursos nem na sua melhoria.
A menção à corporação dos advogados sugere uma outra ordem de problemas. Como serão controlados os responsáveis pelos exames? É uma questão clássica sobre os órgãos de inspeção e julgamento. A disputa sobre o controle externo do Judiciário é um exemplo.
Deve-se ressalvar que a universidade não será de fato reformada se os controles recaírem apenas na ponta do percurso escolar. O ensino superior é alimentado por um sistema de qualidade ainda pior que a sua —a escola primária e secundária. Espera-se que o governo federal, constitucionalmente limitado no assunto, use de imaginação para fazer com que Estados e municípios assumam suas responsabilidades no ensino básico, raiz da árvore carcomida que agora pretende-se começar a reformar.

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