São Paulo, sábado, 18 de março de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Médico que faz aborto legal é discriminado

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Médicos que praticam abortos autorizados por lei estão encontrando resistência por parte de outros médicos e sendo acusados de criminosos por advogados. Alguns são chamados de aborteiros, outros dizem ter recebido ameaças.
"Recebi cartas de advogados dizendo que eu seria processado e que estava sendo cúmplice de um crime", relata o médico Renato de Azevedo Júnior, ex-diretor do Hospital Municipal do Jabaquara.
"O hospital chegou a receber ameaças por escrito", disse Maria José Araujo, ex-coordenadora do programa de saúde da mulher da Prefeitura de São Paulo.
Há cinco anos o hospital Jabaquara vem fazendo abortos autorizados por lei —só recentemente um segundo hospital, o Pérola Byington, vem realizando abortos previstos há 55 anos no Código Penal (leia texto abaixo).
A experiência do Jabaquara, com depoimentos de médicos e pacientes, está contada em vídeo. O "Aborto Legal", com 32 minutos, foi lançado na quarta-feira pela Ecos, entidade que se dedica à sexualidade e reprodução humana.
"Mostramos uma experiência que está dando certo e que deveria ser estendida a todos os serviços de saúde", diz Margareth Arilha, diretora da Ecos e da Comissão de Cidadania e Reprodução.
Segundo ela, a plataforma do então candidato Fernando Henrique Cardoso contemplava serviços de saúde para a mulher que realizassem, inclusive, abortos legais.
Desde 1989, o Hospital Jabaquara fez 57 abortos legais, todos em mulheres que foram vítimas de violência sexual, metade delas adolescentes.
Outras 126 não puderam ser atendidas porque já se encontravam além da 12ª semana de gravidez, quando aumentam os riscos para a mulher fazer o aborto.
"Não é preciso uma autorização judicial", diz Margareth. Decisões da Justiça são necessárias em casos de aborto não previstos em lei, como o de malformação de bebês.
Esse é outro enfoque abordado pelo vídeo que, em última instância, defende o direito da mulher de decidir sobre o filho que quer ter.
"O direito ao aborto é uma questão de cidadania e de saúde pública", diz Margareth.
Segundo dados da Ecos, cerca de 1,4 milhão de abortos clandestinos são realizados por ano no Brasil, sempre envolvendo risco para a vida da mulher.
Diante desse número, é incompreensível que médicos vejam a questão de forma preconceituosa, dizem os profissionais do Jabaquara. Segundo Margareth, muitos médicos ainda se negam a pensar no problema.
O vídeo "Aborto Legal" custa R$ 20,00 e pode ser encontrado na r. dos Tupinambás, 239, Paraíso, tels. (011) 572-7359 e 570-9258.

Texto Anterior: Campanha pelos presos
Próximo Texto: Código de 1940 define legalidade
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.