São Paulo, domingo, 26 de março de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
AI-95
JANIO DE FREITAS
No capítulo dos "Direitos e Deveres Individuais e Coletivos", o art. 5, item IV, da Constituição assegura que "é livre a manifestação do pensamento". O item XVI estende este direito individual à liberdade coletiva: "todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização". Com a ordem aos presidentes de estatais e a decisão divulgada contra manifestações coletivas, portanto, Fernando Henrique Cardoso agride frontalmente a Constituição. Jovens, adultos e idosos, sejam homens ou mulheres, viúvas de hoje e viúvas de amanhã, inválidos de nascença e invalidados pelo trabalho, quem passou a vida pagando a Previdência, quem apenas começou a pagá-la e quem ainda não a pagou mas vai pagá-la, são todos, desde que não sejam donos de empresas, são todos gravemente prejudicados no projeto de modificações da Previdência que o governo mandou ao Congresso. Eis, no entanto, um trecho do discurso de despedida do Senado feito por Fernando Henrique Cardoso em 14 de dezembro: "Tais mudanças (na Previdência) em nada afetarão os atuais aposentados, cujos direitos adquiridos serão devidamente preservados. E haverá uma regra de transição para que os atuais contribuintes exerçam expectativas de direito à aposentadoria pelas normas atuais". As coleções de jornais guardam inúmeras reiterações, por Fernando Henrique Cardoso, do mesmo teor. Autor menos citável, que só chega a sê-lo pelo cargo de ministro da Previdência, Reinhold Stephanes recheou ainda mais as coleções de jornais e os telejornais com afirmações de que "a reforma assegurará os direitos de quem já está aposentado, os direitos de quem já completou tempo e os direitos de quem vai se aposentar". Diante do descumprimento ao compromisso eleitoral e da palavra tantas vezes dada já como governante por Fernando Henrique Cardoso, o que podem fazer os que tomam conhecimento da violação de seus direitos adquiridos? De duas, uma: manter a passividade, que é o modo mais absoluto de negar a qualidade de cidadão, ou manifestar o seu protesto. O senhor de 94 anos levado dos cafundós para um protesto em Brasília, e que por isso levou Gilberto Dimenstein a reprimendas que pareceram irrefletidas, não estava apenas no exercício dos seus direitos de cidadão e deveres de pessoa: estava com o que a Constituição prescreve na mesma medida em que não o está o presidente da República. Há infinitas maneiras de remodelar a Previdência. Divididas entre as leais à Constituição, respeitosas dos cidadãos e fiéis à palavra e aos compromissos. O governo de Fernando Henrique Cardoso escolheu uma das outras. E ele próprio não se quer ater a isto, quer também assolar outros preceitos fundamentais do regime constitucional, como a liberdade de opinião e de manifestá-la. Fernando Henrique Cardoso bradou no Ceará, anteontem, contra a "falsa esquerda e a velha direita carcomida". Era a voz da nova direita. Texto Anterior: Centrais procuram redefinir seu papel Próximo Texto: DF contrariou parecer ao apoiar protesto Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |