São Paulo, domingo, 26 de março de 1995
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Estabilidade do real depende do controle das importações

JOSÉ ROBERTO CAMPOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O sistema de flutuação cambial criado na primeira semana de março obrigará o governo a realizar uma rápida correção de rumos do Plano Real. Após 20 dias de instabilidade nos mercados de câmbio e a revoada de US$ 5,5 bilhões para o exterior, a estabilização da moeda passou a depender da contenção firme das importações.
O resultado da balança comercial (exportações menos importações) será o dado vital que determinará o grau de sucesso da política econômica e também o tempo de vida da atual "banda cambial".
"Ao contrário do planos anteriores, quando a economia era fechada, o aumento do consumo foi suprido por importações", diz Gustavo Loyola, consultor da MCM e ex-presidente do Banco Central (governo Itamar Franco). "Para reverter a situação nos mercados de câmbio é preciso uma redução razoável da demanda".
Esta é a primeira mudança sensível no ambiente do real após a falência do México. Depois de anos consecutivos de superávits comerciais acima de US$ 10 bilhões, o governo agora precisa de um sério esforço para obter um modesto resultado positivo de US$ 5 bilhões a US$ 6 bilhões. "O que era fácil virou grande façanha", considera Carlos Langoni, presidente do BC em 1982, quando a moratória do México abriu o longo período de "crise da dívida" que cortou o acesso do capital externo aos países em desenvolvimento.
Para reduzir a saída de dólares, o governo terá de esfriar as atividades econômicas. Terá, segundo economistas, de fazer o oposto de que vinha pregando até pouco antes da posse de FHC, mais exatamente até 20 de dezembro, quando o México entrou em colapso.
"O México faliu, a Argentina estrebucha e o Brasil está sofrendo", diz um executivo de um grande banco estrangeiro que opera no país. "A crise mexicana sacudiu os programas de estabilização que se apoiavam no câmbio e acabou com a farra de o real valer mais que o dólar. Mais cedo ou mais tarde, a valorização irreal da moeda se transformaria em um problema".
Caminhar na trajetória inversa não é uma tarefa fácil. Ao fazer uma inábil operação de mudanças de bandas cambiais, mexer novamente na paridade do real com o dólar a curto prazo atearia rapidamente um novo incêndio especulativo no mercado financeiro.
O esforço do governo deverá se dirigir para novas medidas complementares ao sistema flutuante de câmbio até ganhar uma batalha de confiança importante —convencer os exportadores a anteciparem os contratos de câmbio (entrada de divisas) e os importadores a postergarem seus pagamentos ao exterior (saída de divisas).
Até o final da semana passada, quando o mercado financeiro tendia à normalidade, era essa a atitude que prevalecia entre importadores e exportadores. Por três dias, o chamado câmbio contratado para exportação e importação fechou com déficits. "Esta situação não se reverterá em março, quando deve haver ainda novo déficit na balança comercial", prevê Loyola. Será o quinto mês consecutivo de vermelho na conta com o exterior.
Este comportamento pode mudar rapidamente com a elevação de juros promovida pelo governo. "O mercado está procurando um ponto de equilíbrio", avalia Demóstenes Pinho, economista-chefe do Unibanco. "O exportador acaba voltando".
Ele exemplifica. Ao antecipar suas receitas de exportação e aplicar seu dinheiro, o exportador conseguia antes das mudanças no câmbio uma receita que equivalia a uma paridade efetiva de R$ 0,93 por dólar. Hoje, com juros mais elevados, ele obtém R$ 0,98. "Com o tempo, acaba ficando pouco atraente postergar o fechamento de câmbio e é por isso que não há espaço hoje para baixar os juros", diz Pinho.
É dos humores de exportadores e importadores que dependerá a estabilidade dos mercados financeiros e a quantidade de dinheiro que, no final do ano, definirá a quantidade que o governo deverá retirar de suas reservas para pagar compromissos de cerca de US$ 15,5 bilhões. Se os humores forem positivos, é possível perder apenas U$ 3 bilhões a US$ 5 bilhões.

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