São Paulo, domingo, 26 de março de 1995
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Uma comédia familiar romana

WILLIAM LI
ESPECIAL PARA A FOLHA

A editora da Universidade de Brasília (UnB) acaba de lançar uma versão portuguesa da comédia "A Sogra", do teatrólogo latino Terêncio (século 2º a.C), considerado o maior comediógrafo latino.
Apesar de Roma ter tido formas embrionárias de teatro, tais como os fesceninos (cânticos dramatizados), a satura (teatro popular) e o mimo (farsas obscenas), é apenas no século 3º a.C. que o teatro propriamente dito se instala no Lácio, com a tradução e imitação dos modelos gregos e a adoção da chamada "comédia nova", então em voga na Grécia. (A tragédia também se estabeleceu em Roma nessa época).
A "comédia antiga" é do século 5º a.C. e tem em Aristófanes seu principal representante, caracterizando-se pela crítica social ou a figuras políticas. A comédia nova, cujos principais representantes são Menandro, Défilo e Fílemon, tem por assunto fatos corriqueiros, trata-se da comédia de costumes, que explora em geral um caso de amor complicado com um final feliz.
Havia dois gêneros de comédia nova em Roma: a palliata (de assunto grego), e a togata (de assunto romano e onde os personagens usavam a toga).
Terêncio (Publius Terentius Afer 185? - 159 a.C.) é sem dúvida o mais requintado entre os comediógrafos romanos —como Plauto e Livio Andronico. Escreveu seis comédias ( Andriana, A Sogra, Heatontimorúmenos, O Eunuco, Fórmion e Os Adelfos) num estilo polido e elegante e para um público refinado e culto. Assim como os outros comediógrafos romanos, Terêncio segue os moldes da comédia nova.
No caso de "A Sogra", trata-se de uma palliata. É talvez a primeira comédia de Terêncio e não teve sucesso. Só foi reconhecida nos nossos tempos; Cícero, que tanto admirava Terêncio e o citava com frequência, nunca fala em "A Sogra". A trama é complicadíssima: trata-se do casamento forçado de um rapaz com uma moça, sendo que ele amava uma cortesã. (Há três personagens prostitutas em "A Sogra"). O assunto renderia uma novela de televisão nos dias de hoje.
E esta edição de "A Sogra" que a Editora da UnB está lançando é excelente: traz uma introdução, 255 notas explicativas e uma vasta bibliografia. O leitor, porém, deve estar prevenido quanto a um aspecto do livro: ele foi traduzido e anotado por Walter Medeiros, da Faculdade de Letras de Coimbra —com a qual a UnB fez um convênio para publicar 36 volumes de clássicos greco-latinos—, e seu português é diferente do nosso. Às vezes nem mesmo encontramos os termos, tipicamente portugueses, no Aurélio.
Mas trata-se, sem dúvida, de uma excelente e erudita edição, recomendável a todos os que se interessam pelos clássicos.

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