São Paulo, domingo, 26 de março de 1995
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Franceses lutam contra independência

JAIME SPITZCOVSKY
DO ENVIADO ESPECIAL

O ano era 1954 e no Vietnã, Beatrice, Gabrielle, Anne-Marie, Huguette, Françoise, Claudine, Eliane, Dominique e Isabelle não representavam apenas nomes femininos trazidos desde a França.
Correspondiam às denominações das posições fortificadas que as forças francesas levantaram em Dien Bien Phu a fim de atacarem as tropas vietnamitas que buscavam a independência.
Desde Saigon, onde estava instalado o comando francês, o general Henri Navarre enfrentava a dura tarefa de garantir a restauração do poder colonial francês, abalado depois da Segunda Guerra.
Em Hanói, Ho Chi Minh já havia proclamado a independência em 1945, primeiro aceita pela França. Mas o medo de ver comunistas no poder e o sonho de restabelecer o império em outros continentes levou o país a deslanchar a Guerra da Indochina em 1946.
As incursões militares francesas no Vietnã começaram em 1858 e quatro anos depois Paris garantia fatia do Oriente para alimentar sua indústria em expansão.
O poder colonial fez, por exemplo, cair o consumo de arroz por camponês no Vietnã, embora a produção aumentasse. Entre 1880 e 1930, com as técnicas trazidas da França, a área cultivada quadruplicou, mas a colheita, em expansão, acabava nos pratos dos consumidores europeus.
Mais de 20 anos depois, o general Navarre escolhia o vilarejo de Dien Bien Phu como a região para construir uma fortaleza militar e atrair os guerrilheiros do general Giap para o combate em campo aberto. Confiando em seu maior poder bélico, queria escapar das emboscadas que os vietnamitas espalhavam pela floresta.
No final de 53, o coronel Christian Marie Ferdinand de la Croix de Castries comandava a instalação do campo. De origem aristocrática, ele era um habilidoso cavaleiro, apreciava jogos de azar e se considerava um grande sedutor.
Os nove nomes de mulheres nas posições fortificadas corresponderiam a suas amantes.
Em Hanói, Giap e os comandantes comunistas recebiam informações sobre a movimentação das tropas francesas.
Em novembro de 53, os vietnamitas começaram o paciente trabalho de cercar o vale de Dien Bien Phu. Na verdade, os franceses haviam montado uma armadilha para eles próprios ao se instalarem numa região cercada por colinas.
Giap percebeu o erro das tropas coloniais e se entusiasmou com a perspectiva de uma rápida vitória.
As tropas vietnamitas se posicionavam nas colinas.
A 13 de março, às 17h, as bombas vietnamitas começaram a cair sobre a fortificação Beatrice. A primeira posição francesa caiu em uma hora. Entusiasmados, os combatentes vietnamitas achavam que iam selar em poucos dias o destino de um campo que simbolizava um dos últimos esforços franceses para se manter no Vietnã.
Mas, na retaguarda, o general Giap começava a repensar a estratégia. Manter o ritmo acelerado de um ataque não garantia a vitória.
Esta viria, certamente, se os vietnamitas asfixiassem os franceses com um longo cerco.
Com o passar dos dias, o coronel Castries começava a enfrentar não apenas a chuva da artilharia vietnamita, mas também o desânimo de suas tropas.
Nem as promessas de que os norte-americanos viriam resgatá-los nem uma adega de 49 mil garrafas de vinho francês foram capazes de mudar a situação.
Depois de 55 dias de cerco, o capitão Ta Quang Luat, acompanhado por quatro soldados, conquistava o bunker do comando francês em Dien Bien Phu. Eram 17h30 do dia 7 de maio de 1954.
Estimativas falam em 1,6 mil mortos do lado francês e 10 mil baixas nas tropas vietnamitas.
A vitória de Giap se concretizou na véspera da abertura das negociações de Genebra, que marcariam o fim do domínio francês em solo vietnamita.
Os acordos de Genebra determinavam que em 1956 haveria eleições gerais para reunificar o país, dividido entre o norte dos comunistas e o sul pró-Ocidente.
Mas o dirigente sulista, Ngo Dinh Diem, um aliado dos EUA, decidiu ignorar o pacto e lançava o país numa turbulência que iria terminar em 1975, com a vitória das tropas do general Giap.

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