São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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Ceme comprou soro pelo dobro do preço

GUSTAVO KRIEGER
DA REPORTAGEM LOCAL

Ceme comprou soro pelo dobro do preço
A Ceme (Central de Medicamentos) do Ministério da Saúde comprou, em novembro do ano passado, 15,7 milhões de frascos de 500 ml de soro fisiológico pelo dobro do preço de mercado. A operação custou R$ 14,5 milhões.
O presidente da Ceme na época da compra, Paulo Diniz, foi mantido no cargo pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.
A Ceme comprou o soro depois de uma concorrência pública, da qual participaram sete laboratórios —cinco foram vencedores.
Cada uma das empresas vencedoras foi selecionada para distribuir o medicamento em uma região do país.
O preço pago pela Ceme sofreu pequenas variações de acordo com cada região, mas o custo médio do soro comprado pelo governo foi de R$ 0,92 pelo frasco de 500 ml.
A Folha obteve cópias de notas fiscais mostrando que os mesmos laboratórios que venderam o soro para a Ceme comercializaram o produto para hospitais cobrando cerca de R$ 0,40 pelo frasco.
O laboratório JP Indústria Farmacêutica, de Ribeirão Preto (SP), vendeu para a Ceme 4,7 milhões de frascos de soro para distribuição na região Sudeste, cobrando R$ 0,84 por unidade.
O mesmo laboratório vendeu 60 frascos de soro para uma empresa de Araxá (MG), por R$ 0,39 a unidade (veja quadro).
O laboratório Halex Istar, de Goiânia (GO), venceu a concorrência para fornecer 118 mil frascos de soro para a região Centro-Oeste cobrando R$ 0,90 por frasco. A mesma empresa cobrou R$ 0,42 por frasco em uma tomada de preço da Universidade Federal de Uberlândia (MG).
Os preços pagos pela Ceme são superiores até mesmo aos cobrados nas farmácias de São Paulo.
A reportagem da Folha fez uma pesquisa em dez farmácias paulistanas na sexta-feira. O preço do frasco de 500 ml de soro variava entre R$ 0,67 e R$ 0,90.
A Ceme diz que, antes de definir o resultado da concorrência, verificou que os valores cobrados pelos laboratórios estavam abaixo dos custos de mercado.
O problema é que esta verificação usou como parâmetro as listas de preços oficiais dos laboratórios, publicados no relatório Brasíndice, que é distribuído para farmácias.
Preparadas quando o governo exercia controle de preços sobre os medicamentos, estas listas oficiais trazem valores até cinco vezes superiores aos custos efetivamente praticados.
O "superfaturamento" das listas oficiais era uma defesa dos laboratórios contra a ameaça de congelamento de preços no setor, feita pelo governo Itamar Franco.
Nestas listas, o "preço" do soro produzido pelo laboratório Halex-Istar é de R$ 2,32 para o frasco de 500 ml.
Na quinta-feira, a Folha entrevistou Zanoni Alves de Carvalho, diretor do laboratório Halex-Istar e presidente da Associação Brasileira de Produtores de Soluções Parenteirais, que reúne os fabricantes de soro.
Zanoni disse que a lista oficial "mostra parâmetros máximos" para o preço dos produtos e admitiu que os valores nela previstos "são praticados muito raramente".
Na mesma entrevista, Zanoni disse que o preço de mercado praticado normalmente pelo seu laboratório é de "cerca de R$ 0,50" pelo frasco de 500 ml de soro.

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