São Paulo, segunda-feira, 3 de abril de 1995
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Lágrimas de Marcelinho redimem futebol

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Foi um dos momentos mais emocionantes que o futebol me ofereceu neste quase meio século de paixão. O jogo, que não valia nada, pegou fogo sob a combustão da velha rivalidade. O Corinthians não só perdia de 1 a 0, como lambia as feridas de um pênalti claro que o juiz não deu logo de saída, e lutava para compensar a expulsão de seu beque Célio Silva, movido apenas por uma garra arcana. Mas esbarrava na sólida barreira palmeirense, até que Marcelinho disparou um torpedo de 25 metros, no ângulo de Velloso. O choro incontrolável de Marcelinho à beira do gramado foi o gesto de purificação e remissão que se cristalizou no último minuto, nos pés do mesmo Marcelinho: 2 a 1, Corinthians.
Foi a redenção, dentro do campo, do futebol, sufocado fora dele.

No meio de semana, ele marcou dois gols, no empate com a Ponte; no sábado, mais dois, na vitória sobre o Bragantino, um deles, de bicicleta. Que mais precisa fazer Bentinho para se firmar como titular do São Paulo, um time que há muito tempo carece de um finalizador dessa estirpe?
E Caio, a menina dos olhos da torcida tricolor? Ora, Caio pode perfeitamente juntar-se a Bentinho nesse ataque, como, aliás, ocorreu neste sábado. Na teoria, haveria de conferir um poder de fogo ainda maior à equipe. Na prática, tenho minhas dúvidas. Explico: Caio é um menino de ouro, bem educado, decidido na disputa de bola, obediente, aplicado e ungido com o dom de goleador, sobretudo quando a bola é alçada sobre a área inimiga. Mas, com a bola nos pés, sua utilidade se reduz sensivelmente. Já Bentinho, um meia de origem, sabe como manejá-la (ou deveria ser penejá-la?). Tem estilo, classe e versatilidade, atributos essenciais para compor o ataque de um time que privilegia exatamente o toque de bola e a inventividade. Ou que pretende fazê-lo.
Por outro lado, apesar da presença de dois volantes marcadores, como Alemão e Mona ou Axel e Donizete, o meio-campo tricolor parece carecer de um poder de destruição maior. Prova disso é que, vira e mexe, Zetti sai de campo como herói do jogo. Quer dizer: a bola foi nele com mais frequência do que deveria. Logo, mais sensato seria incluir outro volante no meio-campo, liberando ainda mais Palhinha e Juninho para a criação. Pois, a conclusão é com Bentinho. Ou alguém ainda duvida?

Soa o gongo e aproveito para inserir o boxe neste espaço futebolístico. O fato é que a fera está solta. Era preciso enquadrar nos limites racistas da sociedade branca aquele arruaceiro. Agora, Tyson transformou-se num militante do Islã, o que, nos EUA, significa ser também um combatente das causas negras.
Eis um adversário muito mais perigoso.

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