São Paulo, segunda-feira, 3 de abril de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Pato Fu surpreende com rock mutante
MARCEL PLASSE
A música "Vida de Operário", gravada pela banda Pato Fu, é de autoria de Marcos Falcão, e não de Falcão, como foi publicado na Ilustrada no dia 3/4. Pato Fu surpreende com rock mutante O "power" trio mineiro Pato Fu fez o primeiro grande disco brasileiro de 95. Com guitarras pesadas, percussão eletrônica e violas sertanejas, "Gol de Quem?" segue a linha da mistura de estilos que dominou o pop do país no ano passado. Não significa que a música se encaixe nos rótulos de "mangue beat" ou "forrócore", nem que Pato Fu tenha começado agora, de olho no mercado. A elaboração da proposta transparece na escolha das versões e citações (inclui Mutantes, Tom Zé, Adelino Moreira, Beatles, Frederick Knight, Falcão, Procol Harum e Catulo da Paixão Cearense). Não há dúvidas de que o Tropicalismo ferve a testa de John, o guitarrista, principal vocalista e compositor do trio. Assim como Caetano Veloso usou "Coração Materno" no manifesto "Tropicália", John gravou "A Volta do Boêmio", de Adelino Moreira -com um "sample" (ou imitação muito parecida) da voz de Nelson Gonçalves. Mas antes que alguém possa gritar "geléia geral brasileira", John pede tempo: "Se tem guitarra e não é jazz, então, para mim, é rock". Ele disse à Folha, em Belo Horizonte, que discorda da tese sobre a morte do rock, encontrada no uso de ritmos brasileiros pela geração 90: "Se Raimundos não é rock, então eu não sei o que é". John fala como autoridade do "udigrudi". Ex-guitarrista do Sexo Explícito (mais tarde, rebatizado Sexplícito), ele já representou a vanguarda alternativa do rock nacional -na década de 80. O próprio Pato Fu começou "underground". Até a multi BMG entrar em campo, o trio era um segredo independente de Belo Horizonte. Seu álbum de estréia, "Rotomusic de Liquidificapum", pelo selo Cogumelo, impressionava pela cacofonia de referências brega-chics, mas bateu na trave. "Gol de Quem?" é menos pesado. As quatro músicas cantadas por Fernanda têm perfeição pop. Mesmo assim, é um estilo de pop mutante -em todos os sentidos. "Mamãe Ama É o Meu Revólver", de Rubinho Troll (ex-parceiro de John no Sexplícito), começa como coisa do grupo americano Nine Inch Nails para se revelar uma música meiga, como só a Rita teen conseguia evocar. A pegajosa "Sobre o Tempo" chega a combinar guitarras inglesas (Jesus and Mary Chain, Cure) com um arranjo entre Novos Baianos, Mutantes e Kid Abelha. "A Volta do Boêmio" acabou sendo a gravação mais elaborada. Marcada pelo baixo de Ricardo, o ritmo pulsa como um chorinho etéreo que se completa com um vocal "cool" de trovador folk. Todas as versões transgridem o original. "Qualquer Bobagem", dos Mutantes, vira um reggae psicodélico com cuíca; "Obla-Di-Obla-Da", dos Beatles, pega carona num trio elétrico; e a "disco music" "Ring My Bell", de Frederick Knight, assume a sonoridade dos Talking Heads (fase "Remain in Light", de 1980). Mas a melhor é "Vida de Operário", de Falcão, mais conhecido por suas letras palhaças do que pelo estilo sertanejo-marxista desta faixa. Com uma mistura de viola caipira, folk de protesto e arranjo sombrio de Angelo Badalamenti, a música comenta a relação trabalho-recessão no país. Desde "Vida de Gado", de Zé Ramalho, o pop não arriscava esse tipo de resmungo engasgado -a não ser que se conte o rap. Disco: Gol de Quem? Banda: Pato Fu Gravadora: Plug/BMG Preço: R$ 20,00 (o CD, em média) Texto Anterior: Ator está em peça de Nanini Próximo Texto: Conferência em SP discute o 'fato clínico' Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |