São Paulo, segunda-feira, 3 de abril de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Chuva impede estréia da ópera "Aida"

IRINEU FRANCO PERPETUO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O rescaldo das águas de março fez "Aida" soçobrar no Dia da Mentira. Marcada para 1º de abril, na Praça da Pedreira do Chapadão, em Campinas, a estréia da ópera foi cancelada devido à chuva que se abateu sobre a cidade.
A enxurrada atiçou a fogueira das vaidades que envolve a produção. Tão babélica quanto a montagem de "Tannhãuser" retratada no filme "Encontro com Vênus", de István Szábó, esta "Aida" está sendo marcada por muita briga.
O "régisseur" Plamen Kartalov era o mais indignado. Queixava-se de ter trabalhado 12 horas consecutivas sem comer nada para concretizar a montagem.
Antes dos portões serem abertos, nos momentos de maior chuva, Kartalov ficou estático, no palco, sem guarda-chuva, "em solidariedade" ao cenário.
Seu alvo preferido era a orquestra. Três músicos se recusaram a tocar porque suas cadeiras estavam molhadas. "Por que eles não se levantam e vão buscar cadeiras novas?", bradava indignado.
Na dança das cadeiras, acabou sobrando para Júlio Medaglia. O maestro providenciou a troca dos móveis, carregando-os.
O início do espetáculo estava previsto para as 21h. Entre idas e vindas dos figurantes, e após três tentativas de início, o cancelamento veio às 21h50, quando começou a chover forte.
No intervalo entre o horário previsto para o início da ópera e seu cancelamento, poderia ter sido encenado o primeiro ato de "Aida". Daí o esforço dos organizadores em começar o espetáculo e a indignação do "régisseur" com o contratempo das cadeiras.
"Existe uma convenção internacional que diz que, se o primeiro ato é concluído, a ópera é considerada feita", afirma o empresário Galvão Maurício, responsável pelo evento.Isto evitaria a necessidade de uma nova récita.
Maurício garantiu ao público que seus ingressos seriam válidos para um novo espetáculo, a ser realizado "na segunda ou na terça-feira".
O adiamento para a segunda-feira era considerado improvável pelos músicos. Muitos dos membros da orquestra, formada especialmente para o evento, tocam também na Sinfônica do Estado, que tem um concerto da série "Jovens Solistas" marcado para hoje no Memorial da América Latina.
A realização de uma nova montagem em Campinas na terça-feira poderia complicar o espetáculo paulistano, marcado para quinta. Isto porque a montagem dos monumentais cenários da Ópera de Roma -um quebra-cabeça de 2.000 peças- demanda dois dias.
Acusada de tudo por todos, a orquestra também estava indignada. Os xingamentos dos músicos, aliás, foi a única música que os alto-falantes transmitiram.
"Cancela, cancela", repetiam, em coro, enquanto os figurantes perfilavam-se para um espetáculo que não aconteceria.
Após o cancelamento, músicos de todos os naipes afirmavam que a chuva poderia causar danos irreversíveis a seus instrumentos. Revoltados, eles diziam não admitir serem escolhidos como os bodes expiatórios do adiamento.
E voltavam as baterias contra a organização. Sem contrato e sem seguro, queixavam-se do atraso de sua refeição e da falta de partituras para metade das estantes.
Impassível, apenas Galvão Maurício. "Não há ópera sem brigas", afirmava, contemporizador. O público que foi à Pedreira do Chapadão, entretanto, esperava que os conflitos se restringissem ao palco.

Texto Anterior: Presidente do fã-clube é presa pelo assassinato
Próximo Texto: Público tenta manter a classe
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.