São Paulo, segunda-feira, 3 de abril de 1995
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Tequila com Orloff

A crise financeira e cambial que abateu o México, abalou a Argentina e chegou ao Brasil se dissemina agora de maneira cada vez mais violenta pela economia real dos dois primeiros países.
O banco central argentino há pouco estimou que perto de 80 bancos encontram-se em dificuldades. Agora vem a notícia -impressionante, para dizer o menos- de que 30 mil estabelecimentos comerciais fecharam na Argentina só nos primeiros 90 dias deste ano.
A queda da demanda e o aperto da liquidez são tais que os preços naquele país registram já dois meses sucessivos de queda -deflação de 0,3% em fevereiro e em março. Note-se que uma redução do nível de preços nem sempre é positiva como se imaginaria em países com tradição superinflacionária. A Grande Depressão dos anos 30 nos EUA, por exemplo, teve como uma das suas características a deflação, reflexo de uma queda brutal no consumo e fator de desestímulo para os investimentos capazes de produzir riqueza, gerar empregos e incentivar o próprio consumo.
Na Argentina, aliás, as pequenas e médias empresas, que respondem por cerca de 70% dos postos de trabalho, são as mais afetadas pela crise. São péssimas notícias num país que, mesmo durante os últimos anos de crescimento acelerado, não havia sido capaz de conter o aumento do desemprego.
Já no México se cogita uma perda de 20 mil empregos este ano só no setor de restaurantes. No primeiro trimestre, 2.000 desses estabelecimentos já fecharam e estima-se que outros 3.000 podem seguir o mesmo caminho até dezembro. E essa é apenas uma ilustração do movimento de retração que se verifica em toda a economia.
Esses desdobramentos são particularmente pedagógicos para o Brasil, já que ilustram bem a magnitude dos custos do desequilíbrio externo. As medidas recentes do governo, é verdade, indicam que a lição foi ouvida. Mas a gravidade da situação e a incrível volatilidade das condições econômicas, que se alteram com rapidez assustadora, exigem acompanhamento minucioso e reações céleres e decididas.
O Brasil, não há dúvida, vai ter de suportar alguns goles de tequila com Orloff. Mas pode-se pelo menos tentar evitar que tenha de amargar a dose inteira.

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