São Paulo, sexta-feira, 7 de abril de 1995
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Filme resgata violência-pastelão

JOSÉ CARLOS RYOKI INOUE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Fui assistir a "Tempo de Violência", o mais recente sucesso de Tarantino. Um clássico dos clássicos, como há muito tempo Hollywood não fazia.
O desempenho dos atores -Travolta, Uma Thurman, Samuel Jackson, Bruce Willis- é excelente; a maneira como Travolta e Jackson dialogam instantes antes de matar é mais do que hilariante.
E a maneira como Travolta reage ao assédio de Uma é não só engraçadíssima, por ser absolutamente irreal, mas também chega a ser dramática pelo dilema que se impõe: o prazer ou a provável morte nas mãos de seu cruel e truculento chefe.
Tarantino consegue encaixar os plots (tramas) secundários maravilhosamente bem, como se estivesse escrevendo um "pocket book".
Aliás, é justamente nesse "encaixe" de plots e underplots (tramas secundárias) que reside o grande truque do escritor de "pulp fiction", pois o objetivo do livro é ser lido de uma só vez, sem a necessidade de grandes dispêndios de fósforo para entender a mensagem do autor.
Esses cortes, contrapontos, flashbacks, recortes e retomadas formam o contexto da "ação" de forma quase independente de um roteiro preestabelecido. Assim, um personagem pode morrer na metade da história e ressuscitar no final sem que isso choque o leitor -ou o espectador, no caso de cinema- ou venha a parecer um erro de roteiro.
Começar uma história pela metade ou pelo fim é truque muito utilizado para chamar a atenção do leitor para alguma coisa que irá acontecer entre o presente (leitura) e o passado (cronológico) ou o futuro propriamente dito.
Um truque que eu utilizo e que, graças ao advento do computador, se tornou muito menos trabalhoso e bastante simples. "Jogar" com os arquivos, com os capítulos e com os parágrafos fica muito mais fácil com os recursos da informática.
Na "viagem" que os personagens fazem pelo plot principal, vão surgindo os plots secundários, muitas e muitas vezes pouco "emendados" com a própria espinha dorsal da trama. Foi exatamente o que fez Tarantino em "Tempo de Violência". E é o que mais chama a atenção em seu filme e o que mais fez com que todos gostassem.
A violência-pastelão era uma das características de Hollywood dos anos 30 e 40, quando a capital do cinema definitivamente se impôs como tal. A violência de Tarantino neste seu filme nos traz de volta um pouco desse clima, que é, fundamentalmente, o clima que o escritor de "pulp fiction" deve procurar criar.

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