São Paulo, sexta-feira, 7 de abril de 1995
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Política não separa gastronomia coreana

HAMILTON MELLÃO JR.

Política não separa gastronomia coreana
A Coréia é mais um daqueles tristes casos em que o povo é separado por mesquinhos motivos políticos. Isto aconteceu quando, em 1984, a então União Soviética dividiu com os EUA, no paralelo 38, as influências na região.
Do ponto de vista gastronômico, não se fizeram diferenças notáveis entre o agora norte pobre e o sul maravilha, a não ser a quantidade de comida em cada prato.
Existe nas Coréias um ditado que diz que Deus criou o alimento e o Diabo o condimento. Eles fazem questão de se aproveitar dessas duas benesses, mas parecem mais tentados a cultuar o senhor dos temperos.
Um amigo meu, desavisado, ficou encantado com a linda cor rubra da sopa que lhe foi oferecida em Seul, só que na primeira colherada ele sentiu um estupor. E a órbita dos seus olhos querendo saltar. Ele tinha sido mais uma vítima de Gochu, a temida pimenta vermelha coreana.
Baseada quase totalmente no conjunto: carne bovina, peixes, frutos do mar e feijões, a cozinha coreana desenvolveu-se de uma maneira particular, apesar de geograficamente ser um apêndice da China e historicamente ter recebido inúmeras invasões japonesas.
Da carne de boi, são preferidos aquilo que chamamos de miúdos: línguas, tripas, rins, fígados e coração, mesmo na carta dos restaurantes mais sofisticados. Isso faz com que, curiosamentee, o filé mignon custe muito mais barato do que um coração.
Se para nós, meros ocidentais, esta inversão soa um absurdo, do ponto de vista anatômico ela se explica: mesmo com muita carne, o boi tem apenas uma única língua, por exemplo.
Como método de cocção, é usada a técnica kui, isto é, o grelhado. Vem daí o prato mais conhecido da culinária coreana, o Bui Go Gui, finíssimos pedaços de carnes churrasqueadas sobre um recipiente com forma cônica.
Este curioso apetrecho tem origem, pela lenda, nos antigos capacetes dos bravos guerreiros manchus. Ao grelhar a carne, adiciona-se óleo de gergelim, alho, gengibre, cebolinhas e a temida gochu.
O mar Amarelo e o do Japão que costeiam todo o país, são particularmente pródigos em peixes e frutos do mar. Vem daí os superlativos abalones coreanos, moluscos respeitados no meio gastronômico mundial, além de algas marinhas fantásticas que, multicolores, são uma fonte de proteína barata.
Os feijões são respeitosamente usados, seja nas bindae duh, que poderíamos comparar com as nossas crepes de farinha de trigo e ovos, mas com consistência mais dura, ou no leite de soja, guarnição comum nas mesas coreanas.
Inusitado porém é o emprego do feijão azuki nas sobremesas, que não são necessariamente doces. A discussão sobre a origem do uso desta leguminosa após o prato principal suscita acalorados debates entre coreanos e japoneses até hoje.
A comida cotidiana da Coréia é bastante simples, um prato de arroz com algas ou feijões e uma sobremesa quase sempre adoçada com mel. Nos casamentos e em outras cerimônias festivas, fazem banquetes orgiásticos de mais de 20 pratos.
O coreano bebe o junjong, um destilado de arroz, semelhante ao sake japonês, ou chá de ginseng para acompanhar as refeições.
Para entrar no mundo gastronômico coreano sem sair da cidade, os caça-restaurantes indicam o Lua Palace, um restaurante que serve basicamente à colônia, o que já é um excelente sinal.

RESTAURANTE LUA PALACE: av. Armando Ferrentini, 182, tel. 277-7823, Aclimação

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