São Paulo, sexta-feira, 7 de abril de 1995
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Kaurismãki corre o mundo atrás de seu estilo

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

Mika Kaurismãki, 39, diz sem nenhum medo que muda de estilo de filme para filme: "Não gosto de me repetir". Acrescenta, meio modesto, meio cético, que um dia talvez encontre seu estilo.
Seus trabalhos -em exibição na Sala Cinemateca desde a quarta-feira, na mostra "Finlândia no Brasil", confirmam essa hipótese, mas de certa forma a ampliam. Com 14 filmes realizados desde o início dos anos 80, Mika é o responsável, junto com seu irmão Aki, por colocar no mapa o cinema finlandês. Mas recusa-se a tomar a Finlândia como um referencial definitivo: "Eu não me sinto finlandês. O mundo é para todo mundo".
Na quarta-feira, chegou a São Paulo com sua mulher, Pia Tikka (também cineasta; seu filme de estréia, "As Filhas de Yemanjá", faz parte do ciclo da Sala Cinemateca), para promover a mostra que começou ontem. Enquanto dava entrevista à Folha, mal continha a inquietação de sair à rua e conhecer a cidade (onde só esteve uma vez, de passagem).
O espírito é de aventura. Mesmo quando filma, prefere o método do documentário. "Gosto de filmar em exteriores. Há filmes que faço sem roteiro, como 'Tigreiro', que foi escrito durante a filmagem, outros em que o roteiro tem de ser bastante modificado em função das condições que encontro", diz.
Um exemplo disso é a sequência do garimpo em "Amazônia", uma das melhores do filme.
Para realizá-la foram usadas apenas três pessoas na equipe, mais o ator. Durante quatro horas, Mika fingiu filmar, sem usar filme, de modo a deixar sua figuração -os garimpeiros- "esquecerem da câmera". Resultou um momento forte, em que o cineasta finlandês conseguiu transmitir uma das idéias centrais do filme: a destruição da selva e a destruição do homem são a mesma coisa.
O importante, sempre, é dar vazão ao acaso. "Gosto de filmes de Hitchcock, mas não me dou bem com filmagens muito planejadas." O diretor admite que a mudança frequente de estilo coloca um problema para o público, que nunca sabe com segurança o que pode encontrar. "O que gosto é de pôr a câmera em qualquer lugar e ver as coisas acontecerem", comenta.
Daí seu interesse pelo Brasil: "Aqui muitas coisas acontecem, na rua. Na Finlândia, todas as histórias se passam dentro de um quarto. Isso não me interessa".
A atitude nômade não tem sido obstáculo para sua carreira. Ao contrário, termina por lhe abrir portas. Acabou de filmar "Condition Red" nos Estados Unidos.
Em maio deve começar a preparação de "Los Angeles without a Map", seu próximo trabalho, comédia adaptada do romance do inglês Richard Reyner. "Será a América vista por um europeu", através da história de um inglês que se apaixona por uma mulher norte-americana.
Como nos filmes que fez no Brasil, quer evitar o olhar europeu, "muito autocentrado", e mostrar encontro e conflitos entre duas culturas: "Mas sem folclore", garante.

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