São Paulo, domingo, 9 de abril de 1995 |
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O Lobo e o Cordeiro
NELSON ASCHER
chamado Baranówicz, quando um lobo, coronel Wolfgang, veio e, sobranceiro, lhe disse: -"Você pensa que sou bobo, que eu não te vejo envenenando o rio há muitos anos e espalhando a Peste?" -"Mas nós morremos séculos a fio, também, de causa igual." -"Não me moleste com esse irrelevante pormenor. Vocês são todos ricos e eu sou pobre." -"Como sou rico se não tenho um cobre? Vocês lobos são donos da maior empresa, enquanto estou desempregado." -"Você conspira e apóia, do outro lado capitalista-ovino-comunista." -"Desculpe-me, não quero ser pedante, mas os ursos de lá, seus caros primos, nos comem por motivo semelhante." -"Você, cosmopolita como vimos, não é nada ariano." -"Como assim? Carneiro se diz áries em latim." -"Sei disso e, embora seja um lobo culto, um Kulturwolf, não lhe darei indulto porque vocês mataram Jesus Cristo." -"Foi a loba romana que fez isto e mesmo que um cordeiro fosse o algoz seria assunto nosso." -"Ovino arisco e cínico, já chega de pilhéria. Ordens se cumprem: vamos, pois no aprisco Farei, após havê-lo tosquiado, com tua pele de cordeiro um manto para aquecer-me neste inverno enquanto nós lobos conquistamos Stalingrado." Desprezando os balidos derradeiros Os outros ruminantes, todavia, pastavam perto sem perder a calma. Wolfgang, formando-se em filosofia anos depois (com tese acerca "D'Alma Lupina e seu Transcendental Destino"), jamais deixou de defender o povo: dedicou-se à política de novo e ainda combate o imperialismo ovino. Texto Anterior: Duas refábulas Próximo Texto: A moça e a minissaia Índice |
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