São Paulo, domingo, 9 de abril de 1995
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O que são 100 mil vezes 3.800?

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA - O Ministério da Educação estuda uma fórmula para manter o professor aposentado na sala de aula: dar-lhe uma bolsa. O plano baseia-se em números assombrosos. Recomendo: se o leitor não quiser se irritar no fim-de-semana, melhor parar de ler agora mesmo esta coluna.
Uma lista com 3.800 nomes de intelectuais mostra que o Brasil está prestes a desperdiçar apenas nos primeiros meses deste ano no mínimo R$ 380 milhões. É a lista de professores universitários federais que pediram aposentadoria.
Segundo a Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação, o país gasta, em média, R$ 100 mil para formar um professor universitário. Se a pós-graduação for realizada no exterior, o custo sobe para até R$ 180 mil.
Multipliquem-se 3.800 por 100 mil e teremos os R$ 380 milhões. Registro importante: não estou levando em conta as aposentadorias dos professores das universidades estaduais, o que poderia dobrar o desperdício.
As discussões sobre mudanças na Constituição provocaram corrida de professores, pedindo aposentadoria. Hoje, eles podem ir para casa com cerca de 50 anos e com um salário ainda maior. Não vou apontar culpados. O ponto essencial: essa corrida pela aposentadoria é um crime contra o país que, gosto de repetir o óbvio, necessita urgentemente de cérebros. Não consigo enxergar nada mais grave na cultura nacional do que gente jovem e preparada, que custou R$ 100 mil ao contribuinte, parar de dar aulas.
Daí surgiu a idéia da bolsa. O professor se aposentaria, mas permaneceria no cargo, com um rendimento extra. A faculdade, em contrapartida, estaria proibida de abrir uma vaga.
O plano tem lógica e, em tese, interesse público, já que manteríamos na sala de aula professores importantes. Mas, se conheço um pouco meu país, aposto que, em breve, teremos abertura de vagas mais a distribuição indiscriminada de bolsas.
PS - Quase ninguém sabe: o professor que estuda no exterior à custa da lavadeira e do operário, por exemplo, desconta o tempo para aposentadoria. Por essas e outras (muitas outras), não entro nessa lengalenga histérica de que as mazelas nacionais estão concentradas no Congresso ou em Brasília.

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