São Paulo, terça-feira, 11 de abril de 1995
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Whit Stillman faz literatura no cinema

RICARDO CALIL
DA REDAÇÃO

Desde Woody Allen, o cinema não conhecia tamanha verborragia. Em "Barcelona", filme que estréia nesta sexta-feira em São Paulo, o diretor norte-americano Whit Stillman, 42, reafirma sua crença no cinema da palavra.
Por isso, ele acredita, suas influências se encontram antes na literatura (Jane Austen, Scott Fitzgerald, Tolstoi) do que no cinema.
"A cultura cinematográfica raramente alcança a riqueza da literária. Filmes são, em geral, reducionistas", afirmou à Folha ontem, em São Paulo, onde divulga seu novo filme.
Antes, Stillman passou pelo Rio e por Búzios, onde "Barcelona" foi exibido no festival da cidade, durante o fim-de-semana. Hoje, volta a Nova York.
Revelado em 90 com "Metropolitan" (seu primeiro filme, indicado ao Oscar de roteiro original), Stillman afirma que o cinema vem redescobrindo os diálogos.
Para confirmar a tese, lembra as indicações ao Oscar de "Tempo de Violência", de Quentin Tarantino, e "Tiros na Broadway", de Woody Allen, com quem vem sendo comparado por seus diálogos sofisticados e cortantes.
Diálogos são, aliás, a distinção e a ruína de "Barcelona". Já foram acusados de elitistas e irrelevantes (um dos personagens passa minutos discutindo o lado certo para se barbear).
"Muitos espectadores ficam impacientes porque não conseguem acompanhar os detalhes. Mas acho que não é possível sustentar um filme falando coisas desinteressantes", afirma Stillman.
Segundo ele, "Barcelona" é um filme destinado a centros urbanos. "Tenho muita esperança no público de São Paulo. Aqui, as pessoas se parecem com o personagem principal -sérias e muito preocupadas com seu trabalho."
Na Europa, o filme virou cult em lugares como a London School of Economics, entre estudantes recém-saídos da pós-graduação.
Stillman não teme a fama de cult. "Se você está fazendo seus primeiros filmes, o título pode até ajudar no retorno financeiro."
Com o sucesso de "Barcelona" (o filme custou US$ 3,2 milhões e arrecadou o dobro), o cineasta pretende arriscar passos maiores.
Seu próximo filme, "The Last Days of Disco" (Os Últimos Dias da Discoteca), deve ser protagonizado por Bridget Fonda, Winona Ryder ou Gabrielle Anwar.
"De discoteca mesmo, o filme só deverá ter o 'background' e o título. A protagonista deverá ser uma jovem mulher com quem o público poderá se identificar facilmente, ao contrário dos personagens de 'Barcelona'."
Em "Barcelona", os protagonistas são o executivo Ted (Taylor Nichols) e o militar Fred (Chris Eigeman), primos norte-americanos que enfrentam as mulheres catalãs e os protestos anti-EUA da era pós-Franco.
"É um choque entre a sensibilidade da Nova Inglaterra e a do Mediterrâneo." E também um retorno às décadas de 70 e 80.
"Tudo aconteceu quando Donna Summer estava tocando. Ou foi, pelo menos, quando eu percebi", diz o protagonista Ted ao descobrir que está apaixonado.
Os personagens são inspirados na vivência de Stillman. Mesmo a passagem mais hilariante, em que Ted dança "Pennsilvanya 6500" lendo a Bíblia, é autobiográfica.
Filho de um influente político ligado ao governo Kennedy e formado em Harvard, Stilman casou em 1980 com uma espanhola.
Desde então, vem se revezando entre Barcelona e Nova York. Foi agente de cineastas espanhóis e ator em filmes de Fernando Trueba e Fernando Colomo -experiência que prefere não repetir. "Eu era horrível. O que gosto mesmo é escrever roteiros."

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