São Paulo, quinta-feira, 13 de abril de 1995
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Lamentação precoce

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA - "Um poder que não se assume não é poder." Com essa frase FHC deu ontem sua mais aguda estocada no Congresso, onde tem experimentado surra atrás de surra. Essas lamúrias não são originais pelo conteúdo -um nhenhenhém comum entre presidentes para explicar suas falhas. Mas pela precocidade em que são lançadas.
O tom da queixa reforça a sensação de que o presidente, com seus escassos três meses no Palácio do Planalto, adotou discurso de final de governo. Esse período é particularmente frustrante: os "aliados incondicionais" começam a ir embora e até o café servido é frio.
Nenhum presidente em toda a história do Brasil assumiu com um conjunto de situações tão favoráveis. Compare-se, por exemplo, com Fernando Collor.
Ao assumir, Collor estava montado num partido minúsculo, tinha a desconfiança do Congresso, dos empresários, da imensa maioria das lideranças sindicais e dos chamados formadores de opinião. Herdou uma inflação estratosférica, em meio a cicatrizes profundas deixadas pela eleição.
Apesar do ínfimo apoio entre deputados e senadores, Collor aprovou o que quis no Congresso. Chegou ao máximo de congelar a caderneta de poupança e a conta corrente, o que é próximo a simplesmente meter a mão no bolso do indivíduo.
O Congresso aprovou aquele pacote amarguíssimo, na suposição de que não deveria apostar na ingovernabilidade do novo governo. E, claro, no temor de enfrentar um presidente eleito democraticamente.
Nenhuma das medidas propostas por Fernando Henrique -nem mesmo na Previdência- é tão ousada como, por exemplo, o congelamento da poupança.
Moral da história: o problema é do próprio presidente. A frase sobre um "poder que não se assume" encaixaria tanto uma estocada quanto uma autocrítica.
PS - Até dezembro do ano passado, o valor da dívida dos cem maiores caloteiros do Banco do Brasil chegava a R$ 6 bilhões. É cerca de 7,5 vezes o que se gasta por ano com merenda escolar para 30 milhões de estudantes. Minha dúvida: se fosse um banco privado a dívida seria do mesmo tamanho?

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