São Paulo, sexta-feira, 14 de abril de 1995
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Governo pode voltar a restringir consumo

CARLOS ALBERTO SARDENBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

Aumentaram muito nos últimos dias as chances de o governo baixar novas medidas de contenção do consumo. O objetivo será limitar e encarecer ainda mais as vendas a crédito.
A tendência favorável a um novo arrocho, dentro do governo, decorre de três fatores: indicadores de atividade econômica muito forte em março e início de abril; reajuste do salário mínimo e dos demais salários atrelados a ele; e, pressões generalizadas por aumento de preços.
O problema principal não está no consumo. Ao contrário, a economia vai bem quando as pessoas estão comprando, o comércio vendendo e a indústria produzindo e empregando gente.
O problema ocorre quando a oferta de produtos, pelo comércio e pela indústria, não acompanha o crescimento do consumo. Quando há mais consumidores do que mercadorias na prateleira o vendedor pode aumentar preços.
É o que está acontecendo neste momento. Embora industriais e comerciantes venham afirmando que o crescimento das vendas está caindo, os indicadores mostram outro panorama.

Aquecimento
Dois desses indicadores chamaram a atenção. Em março, a indústria automobilística bateu recordes de produção e venda. E continua havendo fila para a compra de carros. O consumo de energia elétrica para fins industriais continuou crescendo.
E isso no primeiro trimestre do ano, que normalmente é fraco por causa das férias de verão, do carnaval e porque as pessoas já compraram no Natal.
Tudo indica que a indústria brasileira está chegando ao limite de sua capacidade de produção. A indústria já aumentou os turnos de trabalho e já fez adaptações possíveis para produzir mais com as mesmas instalações.
Novos aumentos só com investimentos em ampliação ou novas fábricas. E leva pelo menos um ano para que as novas instalações comecem a abastecer os mercados.
Até aqui, o governo podia suprir a carência da produção local com a importação. Mas as importações cresceram demais do final de 1994 para cá, superaram as exportações e o país passou a ter déficit no comércio externo.
Para combater esse déficit o governo encareceu as importações, desvalorizando o real e aumentando o Imposto de Importação. Reduzida a alternativa de suprir a carência da produção local com importações, só resta ao governo tentar restringir a capacidade de consumo. E como o grosso das vendas se faz a crédito, é esse tipo de negócio que será atacado.

Dinheiro demais
Segundo a Folha apurou, o governo parte do seguinte ponto de vista: "se há consumo forte, isso significa que há liquidez", expressão que os economistas utilizam para dizer que as empresas e as pessoas estão com dinheiro disponível para gastar.
Para reduzir essa disponibilidade de dinheiro o governo só tem a alternativa de aumentar os depósitos compulsórios no Banco Central. Hoje, por exemplo, se um banco empresta R$ 100 para uma pessoa ou empresa, tem que depositar R$ 15 no BC. E esses R$ 15 não rendem juros.
Assim, para emprestar R$ 100 o banco precisa captar R$ 115. É possível que o BC eleve esse depósito compulsório, tornando-o progressivo. Quanto mais o banco emprestar, mais deixará depositado, sem rendimento, no BC.
Com isso, o BC retira dinheiro de circulação e ainda encarece os empréstimos, tornando-os menos atraentes.
Essa medida vai atrapalhar todos os crediários. Quando uma loja vende uma televisão a prazo, alguém está emprestando dinheiro para a loja, pois esta precisa pagar a televisão para o fabricante.
Se o fabricante dá prazo para a loja, alguém está emprestando para o fabricante, que precisa de dinheiro para pagar salários, custos, matéria-prima.
E assim por diante, em algum ponto da cadeia produtiva, tem um banco que captou dinheiro de quem tem sobrando e emprestou para quem precisa. Ao limitar e encarecer esses empréstimos, o BC reduz o consumo em toda a cadeia produtiva.
Esse deve ser o núcleo das novas medidas. A idéia não é provocar retração, mas redução na velocidade de crescimento do consumo e da economia.
Se mantido o ritmo do primeiro trimestre, o país cresceria mais de 8% em 95. A equipe econômica acha que qualquer número acima de 5% é exagerado e pode causar falta de produto e inflação. E o governo tem instrumentos para forçar a redução da economia.

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