São Paulo, segunda-feira, 24 de abril de 1995
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A quebra do monopólio do resseguro

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Recentemente, na posse do novo superintendente da Superintendência de Seguros Privados (Susep), o ministro da Fazenda falou a respeito da necessidade da abertura do setor de seguros, inclusive para empresas estrangeiras. A fala foi muito bem vinda, entre outras coisas porque nos últimos tempos nenhum ministro da Fazenda havia se ocupado com a atividade seguradora, e as palavras do sr. Pedro Malan não só demonstram a preocupação do governo com um tema da maior importância para a economia nacional, como demonstram o conhecimento pessoal do ministro sobre o assunto, o que é importantíssimo quando este diz respeito a números da ordem de US$ 30 bilhões em cinco ou seis anos e US$ 20 bilhões em muito menos tempo.
A atividade seguradora brasileira, ao longo dos últimos dez anos, passou por um dos mais violentos processos de desregulamentação sofridos por um setor econômico no país. De uma atividade completamente vigiada e regulamentada, com tarifas únicas comuns e obrigatórias para todas as seguradoras, neste curto espaço de tempo o setor passou para a liberdade quase total, com as seguradoras balizadas apenas por seus limites técnicos, completamente livres das ingerências do IRB (Instituto de Resseguros do Brasil), que perdeu muito do seu poder de ação com o aparecimento dos "pools" de cosseguros.
Explicando melhor, o IRB é o detentor do monopólio de fato da atividade de resseguro no Brasil. Quer dizer, o IRB é a única empresa a fazer os resseguros das companhias de seguros em operação no país, o que, na prática, durante quase 50 anos lhe permitiu impor tarifas únicas para todo o mercado, independentemente dos resultados desta ou daquela companhia serem completamente diversos, com esta ganhando e com aquela perdendo dinheiro.
Para o instituto, esta diferenciação não tinha qualquer importância e a consequência desta postura era a falta de interesse das seguradoras em se aperfeiçoarem, ou buscarem maior eficiência, já que, para todos os efeitos, as boas e as ruins seriam colocadas num saco único e remuneradas de acordo com as conveniências do IRB.
Ao longo do governo Sarney -que, se foi um desastre sem tamanho para o país, para o setor de seguros, especificamente, foi uma benção, graças à ação do sr. João Régis à frente da Susep-, a atividade começou a ser repensada e desregulamentada, com as seguradoras ganhando autonomia e liberdade para desenvolverem suas próprias tarifas de automóveis (até hoje a maior carteira do mercado) e para concederem descontos comerciais em incêndio, que na prática baixaram os prêmios da carteira para patamares até 60% menores.
A primeira consequência deste movimento foi uma série de tarifas erradas, que causaram prejuízos de vulto para várias empresas. A segunda, foi uma guerra de preços absurda, principalmente nos seguros de automóveis, que causou o maior prejuízo operacional da história do seguro brasileiro no final de 1993.
Como resultado desse aprendizado selvagem, no começo de 1994 as principais seguradoras do país resolveram disciplinar o setor, adotando premissas comuns, que foram respeitadas por todos. Ao chegar no final do ano, as seguradoras descobriram que nunca haviam ganho tanto dinheiro como no segundo semestre de 1994, com o setor crescendo não só porque os seguros estavam mais caros, mas porque um número maior de apólices havia sido vendido, inclusive de seguros até então pouco contratados.
Este quadro dá a certeza de que as seguradoras brasileiras, ao longo destes dez anos, aprenderam a andar sozinhas e estão indo muito bem. Ainda existem distorções sérias, principalmente nos custos administrativos e de distribuição dos seguros, mas, grosso modo, elas estão aptas a concorrerem com qualquer outra seguradora do mundo. Tanto isto é verdade que a primeira seguradora estrangeira a aparecer no ranking das maiores seguradoras em operação no país é a décima colocada, e o seu índice combinado é pior do que o de suas principais concorrentes nacionais.
Ao falar em abertura do mercado, o ministro da Fazenda não fez mais do que destacar o trabalho neste sentido que vem sendo desenvolvido pela Susep desde a implantação do Plano Real, em julho do ano passado.
Estudos sérios desenvolvidos pela autarquia apontam claramente para a quebra do monopólio do resseguro do IRB como primeiro passo para se pensar num mercado realmente aberto e interagindo a nível mundial. Monopólio que, como já demonstrei em mais de um artigo nesta Folha, é de fato e não baseado na lei, o que permite que a sua quebra seja feita de forma bem menos dolorida do que as esperadas em outros setores.
Conversando com alguns dos principais executivos das principais companhias de seguros brasileiras, apareceu de forma clara que a imensa maioria delas já está negociando com resseguradores estrangeiros, e que provavelmente conseguirão colocar os seus resseguros com taxas até 25% mais baratas do que as cobradas pelo IRB.
Ora, o presidente do IRB, que é -pasmem vocês!- um homem do mercado, tem falado em abrir o monopólio num prazo de dois anos. Só que dois anos é muito tempo e o IRB vai ser atropelado pelos fatos se não se apressar em se adequar à nova realidade.
O Mercoseguros é inexorável e a liberdade operacional é fundamental para o seu sucesso. As grandes seguradoras brasileiras já estão operando nos outros países integrantes do bloco e estão operando também em resseguros. Assim, para que dilatar um assunto que pode ser resolvido de forma satisfatória para todos e em especial para o segurado?
Os estudos da Susep mostram que a experiência da Comunidade Econômica Européia na abertura dos mercados de seguros foi bem sucedida por começar com a abertura do resseguro. Por que não se fazer a mesma coisa aqui?

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