São Paulo, terça-feira, 6 de junho de 1995
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O Nobel de Economia

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Leio, na coluna de ontem de Gilberto Dimenstein, frase do ex-ministro Mário Henrique Simonsen a respeito dos juros, cuja essência é a seguinte: ``Tudo o que a Fiesp quer é mais inflação".
Pena que ninguém perguntou por que a Fiesp (ou o empresariado de modo geral) gostaria de mais inflação. Se se fizesse a pergunta, a ``boutade" se diluiria como o que de fato é: mera bolha de sabão.
Primeiro, porque até meu neto Tiago, que nem fez três anos ainda, já sabe que quem tem dinheiro e sabe aplicá-lo ganha dinheiro com inflação alta, média, baixa, baixíssima, altíssima ou zero. É assim desde que o mundo é mundo.
Segundo, porque, no caso particular brasileiro, o empresariado encheu as burras de ganhar dinheiro no tempo em que a inflação era baixa, nos idos do famoso ``milagre brasileiro". Simonsen tem idade suficiente para lembrar-se.
Terceiro, porque a inflação alta não é necessariamente uma aliada do industrial. Basta olhar séries estatísticas recentes: a atividade industrial em São Paulo desde 1989, o ano da mais recente disparada inflacionária, foi caindo ano a ano até 1992. Tomando-se 100 como referência para 89, caiu para 88,6 em 90, para 87,4 em 91 e para 83,8 em 92.
Só voltou a ser maior do que os 100 de 1989 em 1994, exatamente o ano que foi metade de inflação alta e metade de inflação baixa. E a produção explodiu justamente no período de inflação baixa.
Quer-se outra série estatística? IBGE, pesquisa industrial mensal: a produção industrial caiu em 90 (sobre 89) e voltou a cair em 91 e 92, sempre anos de superinflação.
É claro que o empresariado não morreu de fome por isso, mas os números provam que a inflação alta não é sinônimo de ganhos certos para a atividade produtiva, embora o seja para a especulação. O que, de resto, é o óbvio ululante.
Nesse ritmo tatibitate de argumentos, algum brasileiro ainda vai provar que inflação baixa é boa para o pobre mas prejudica o capitalista e, por extensão, o capitalismo. É capaz até de ganhar o Nobel de Economia.

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