São Paulo, sábado, 10 de junho de 1995
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Lei prevê 'doação automática'

ANTONIO ROCHA FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um projeto de lei aprovado pela Câmara de São Paulo prevê que todas as pessoas que morrerem na cidade, inclusive estrangeiros, terão seus órgãos automaticamente retirados para doação, a menos que se cadastrem, em vida, no Camund (Cadastro Municipal de Não-Doadores de Tecidos, Órgãos ou Partes do Corpo).
A criação do Camund está prevista pelo projeto, do vereador Paulo Roberto Faria Lima (PMDB). O projeto depende de sanção do prefeito Paulo Maluf, que deve se manifestar até dia 19.
A principal mudança da lei é o fim da necessidade de autorização da família para retirada dos órgãos de uma pessoa morta. Se ela não estiver no Camund, seus órgãos serão considerados disponíveis.
A lei abre a possibilidade de uma pessoa ter seus órgãos retirados antes de a família saber.
O vereador Faria Lima, 31, diz que essas questões podem ser abordadas na regulamentação da lei, se ela for sancionada pelo prefeito. Segundo ele, a lei quer ``agilizar o processo de doação".
Para Sueli Dallari, 44, professora de direito sanitário da Faculdade de Saúde Pública da USP, a lei é ``inconstitucional e ilegal". ``Ela fere a lei federal 8.489, de 18 de novembro de 92, que tem abrangência nacional, e o princípio da dignidade humana."
Segundo o vereador Faria Lima, a Constituição prevê que todos têm direito à saúde e à vida, ``o que é garantido pela nova lei". ``A lei municipal não contraria a Constituição, que é a lei maior."
Segundo Sueli, pela lei 8.489 ``se não houver manifestação favorável da pessoa em vida, o médico precisa de autorização da família para retirar os órgãos".
O médico Silvano Raia, 64, professor de cirurgia da Faculdade de Medicina da USP e ex-secretário municipal da Saúde, vê a nova lei com simpatia. Raia é o pioneiro em transplantes de fígado no país.
``A lei é atraente porque o doador que tiver rompida sua autonomia de dispor do próprio corpo por causa da lei também poderia ser beneficiado por ela."
Mas Raia afirma que a lei ``deve ter pouco efeito prático". Deficiências da rede pública de saúde poderiam dificultar a retirada e transplante de órgãos, mesmo com maior número de doadores.
(ARF)

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