São Paulo, domingo, 18 de junho de 1995
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Pensamento da Cepal ainda continua vivo

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A falta de clareza comunicativa pode vitimar as mais elaboradas formulações conceituais. Um instrumento adequado de política econômica, operado com ruído informacional, torna-se inócuo ou tem efeitos contrários ao esperado.
Mal-implementados ou não, malcomunicados ou não, fica no ar uma pergunta central: é afinal possível a inovação conceitual no campo dos modelos de desenvolvimento econômico?
O tema, excitante no máximo para frequentadores de alguns corredores acadêmicos, caiu sob o holofote do articulista e membro do Conselho Editorial da Folha, Luís Nassif, na semana passada.
Nassif identificou e criticou, nas idas e vindas da política brasileira de comércio exterior, a ressurreição do velho pensamento da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina, instituto financiado pelas Nações Unidas).
A Cepal notabilizou-se por criticar nos anos cinquenta os modelos ortodoxos de desenvolvimento pautados pela liberalização comercial. O modelo de ``substituição de importações" foi em parte fruto dos laboratórios da Cepal.
Desde então muito mudou. Hoje pode-se dizer, com o eterno risco das simplificações, que o mundo das teorias do desenvolvimento divide-se em quatro ``blocos".
O primeiro, identificado à ortodoxia liberal, ganhou o apelido de ``Consenso de Washington". Mutante -temas como governabilidade e sustentabilidade entraram na agenda-, o Consenso continua firme e forte depois da crise mexicana. Insiste em que se os países emergentes continuarem a liberalizar, privatizar e desregulamentar, terão o ``Reino dos Céus".
O segundo bloco, de oposição radical ao Consenso, é o dos protecionistas renitentes. Dessa perspectiva ainda seria possível promover convergências entre burguesias nacionais e outros interesses contrariados pela globalização capitalista. Se estaria então de fato ressucitando um modelo defensivo-progressista com pitadas de saudosismo desenvolvimentista.
Entre esses dois modelos-caricatura, contudo, pode-se identificar pelo menos mais duas alternativas. Uma é a pretensão asiática a um novo modelo de desenvolvimento baseado nos sucessos do Japão.
Os japoneses nunca acharam inspirador qualquer tipo de consenso articulado em Washington. Nos últimos anos passaram a defender, ainda que dizendo ``sim" ao Ocidente, seu próprio ``não".
Como várias vezes ressaltou Bresser Pereira, hoje no governo FHC, os japoneses gostam da diferença sutil entre a economia ``orientada para o mercado" e a ``condicionada pelo mercado".
Finalmente, a Cepal. A verdade é que o modelo de substituição de importações foi abandonado e, em seu lugar, surgiu o modelo de ``transformação produtiva com equidade". Para ser sustentável, esse modelo exige sofisticação crescente na inserção internacional das economias latino-americanas.
Isso nada tem a ver com protecionismo. Significa habilitar-se para aproveitar os ciclos expansivos mundiais, mas também para resistir aos ciclos adversos e à crescente instabilidade financeira.
Quem quiser saber mais, leia ``Una síntesis de la propuesta de la Cepal", na ``Revista de la Cepal" de abril. E ressucite junto.

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