São Paulo, segunda-feira, 19 de junho de 1995
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Gerar impacto não basta para convencer consumidor

NELSON BLECHER
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma nova marca de margarina surge nas prateleiras. Para anunciar a novidade -a fórmula contém manteiga- o comercial sugere à telespectadora que é como juntar o rosto do marido ao corpo do ator Vitor Fasano.
Submetido a um teste antes da veiculação, o filme alcançou elevados índices de impacto e persuasão, além de elogios pela execução e idéia original. Caso fosse levado ao ar, no entanto, correria o risco de vender o produto errado.
É que consumidoras submetidas ao teste foram atraídas pelo conteúdo estético e achavam que se tratava de um produto diet. O diferencial era o casamento de margarina com manteiga.
Até atingir o ponto de compreensão, foram criadas mais duas novas versões. E o comercial da margarina Manty que passou a ser veiculado neste ano saltou do apelo erótico para o humorístico, com uma vaca verdadeira e outra falsa, que fugia do ordenhador.
Criatividade e pesquisa nunca foram irmãs siamesas. Na verdade, publicitários e pesquisadores sempre viveram às turras -uns defendendo a imaginação e outros a lógica e a realidade.
Como não existe uma ciência da propaganda, o ramo progride na base da experimentação, que pode sair caro para o anunciante.
É o preço, uma vez que não se conhece filme perfeito que tenha sido executado apenas com base em subsídios de pesquisas.
O que as pesquisas podem fazer é soar sinais de alerta a desvios exagerados de alvo que às vezes acometem a imaginação criativa. Alguns desses sinais foram detectados pela Indicator, uma consultoria paulistana.
Depois de testar 216 comerciais de 131 marcas e 58 categorias de produtos, a Indicator aponta algumas idéias. Os testes revelaram que comerciais de novas marcas têm dificuldade de obter bons índices de lembrança e persuasão.
Devem se concentrar na transmissão correta da marca e dos benefícios do produto para conseguir conquistar o consumidor.
Somente as marcas tradicionais e consolidadas no mercado podem se dar ao luxo de veicular campanhas com menor foco na mensagem -ainda assim desde que sejam intercalados alguns filmes mais dirigidos ao produto.
O Festival Internacional de Filme Publicitário de Cannes, que tem início hoje, costuma ser pródigo na exibição de comerciais em que os produtos anunciados parecem ser meros coadjuvantes nos roteiros dramáticos. Mas a maioria é de marcas corporativas consolidadas há décadas, que ocupam seu degrau na mente do consumidor.
Outra lição da pesquisa é de que o impacto e a memorização gerados pelos filmes nada têm a ver com sua capacidade de persuasão. De 70 comerciais testados, 84% geraram índices de lembrança e impacto acima da média e 59%, abaixo. Mas o índice de persuasão alcançado foi praticamente o mesmo para os dois grupos.
Segundo a Indicator, lembrança e impacto remetem diretamente à forma do comercial. Significa que quanto maior for o índice de lembrança, melhor avaliada será a execução do comercial.
Já a capacidade de persuasão guarda relação com os benefícios transmitidos pelo filme.
Nenhuma distinção foi observada ao se cotejar reações dos públicos masculino e feminino. Mas os telespectadores de classes sociais mais altas tendem a memorizar e apreender melhor as mensagens. Também nesse caso não houve diferença significativa no aspecto de persuasão dos comerciais.
Os dados mais curiosos desse levantamento se referem ao potencial de cada categoria. Comerciais de tabaco obtiveram os mais elevados índices de lembrança e impacto (86%) e os menores em termos de persuasão (13%).
Isso revela fidelidade às marcas líderes de cigarros, menos vulneráveis às investidas de concorrentes. Tendência semelhante foi delineada em relação aos filmes que promovem bebidas.
Devem se manter atentos, no entanto, os fabricantes de produtos para o lar. Dos filmes testados nessa categoria, 43% se revelaram persuasivos, ou seja, capazes de virar a cabeça do consumidor na direção da marca concorrente.

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