São Paulo, segunda-feira, 19 de junho de 1995
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Livros descortinam o nascimento da TV

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dois livros -``Private Screenings, Television and the Female Consumer" (Exibições Privadas, Televisão e o Consumidor Feminino) e ``Make Room for TV" (Abrir Espaço para a TV)- exploram os primeiros anos da televisão nos Estados Unidos de maneira inovadora.
São trabalhos que falam da história da televisão na casa das pessoas, longe das economias e políticas das grandes emissoras.
O primeiro é uma coletânea de artigos que abordam as relações entre televisão, família, mulher e raça. O segundo é um livro sobre o imaginário construído em torno do aparelho de televisão quando ele foi introduzido em larga escala. Ambos falam de comerciais, revistas populares, ``soap-operas" e ``sit-coms" do passado.
Não podiam faltar análises politicamente corretas. Mas a maioria dos artigos vai além da denúncia da discriminação. Lynn Spigel, autora do livro e organizadora da coletânea, mostra que o advento da televisão nos Estados Unidos está conectado com processos de redefinição das relações entre o espaço público e o privado.
Em seu trabalho, ficamos sabendo como o novo eletrônico foi apresentado ao grande público na imprensa popular. ``Aqui está a televisão, sua janela para o mundo", era o título de um manual de introdução ao aparelho.
O preceito foi aplicado literalmente nas ``sit-coms". A suíte do casal Ricardo de ``I Love Lucy" era decorada com uma ampla janela que descortinava uma vista das montanhas de Hollywood. O cinema estava agora ao alcance de todos, sem sair de casa.
A televisão simbolizava progresso. Estava ligada a uma utopia futurista que encontrava eco na corrida espacial ou na redefinição de espaços promovidos pela arquitetura funcional modernista.
Os comerciais insistiam na obsessão por aproximar distâncias intransponíveis. Em uma propaganda da ``Emerson", uma televisão mostrava a imagem da estátua da liberdade e a silhueta de Nova York. O aparelho flutuava no espaço sideral.
Revistas femininas como ``Better Homes and Gardens" (uma espécie de ``Casa e Jardim") especulavam sobre possíveis efeitos nefastos da televisão, como a perda de visão.
Mas se dedicavam também a fornecer dicas sobre seu melhor aproveitamento como objeto decorativo. Ou sobre como não deixar que os maridos fossem seduzidos pela telinha.
A televisão se multiplicou nos Estados Unidos do pós-guerra com uma rapidez inédita. Em 1955, metade das residências americanas já possuía o aparelho. Essa literatura aponta a relação entre a indústria de televisão e a privatização da vida nos Estados Unidos do macarthismo.
O discurso sobre a televisão expressa uma certa teatralização e espetacularização da vida doméstica. Campanhas publicitárias, revistas populares, livros de decoração de interiores revelam a maneira pela qual a televisão foi classificada na época. Às vezes um texto ou outro resvala para a crítica panfletária. Mas a grande novidade está em buscar entender o significado da telinha nos termos dos consumidores da época.

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